Numa rara coincidência, junto com o romance Carcaça de Negro, de Mário Maestri, me chegou às mãos outra obra mestra sobre o tema da escravidão. São três volumes com quinhentas páginas em média cada um deles, mas a leitura nunca se torna cansativa.
Seu autor é Laurentino Gomes, que se consagrou com três obras premiadas: 1808, sobre a fuga de Dom João VI e da corte portuguesa para o Brasil; 1822, que mostra em detalhe os bastidores da proclamação da Independência do Brasil; e 1889, também com cenário minucioso, sobre a Proclamação da República.
Desde seu primeiro livro, sobre as situações criadas com a presença da corte portuguesa no Rio de Janeiro, fiquei aficionado pelo estilo do autor. Ao contrário dos largos panoramas dos livros de História, Laurentino Gomes escreve verdadeiras reportagens sobre os acontecimentos observados. Nascido em Maringá, formou-se em Jornalismo na Universidade Federal do Paraná. E tornou-se um jornalista especializado em investigar fatos e situações esquecidos, ou desconsiderados, pelos historiadores.
Esta sua nova trilogia aborda o tema da escravidão em três períodos, assim demarcados:
- ESCRAVIDÃO – Volume I: Do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares.
- ESCRAVIDÃO – Volume II: Da corrida do Ouro em Minas Gerais até a chegada da corte de Dom João ao Brasil.
- ESCRAVIDÃO – Volume III: Da Independência do Brasil à Lei Áurea.
A série começa com esta epígrafe colhida, para dar o tom geral da narrativa, nos escritos do Padre Antônio Vieira, que foi missionário jesuíta na Bahia. A frase é de 1691:
“O Brasil tem seu corpo na América, e sua alma na África”.
O primeiro volume saiu publicado em 2019, depois de cinco anos de pesquisas e entrevistas realizadas pelo autor, no Brasil, mas também na África, em Portugal e em outros países com marcas da escravidão no passado. O terceiro e último veio à luz três anos depois, em 2022. Uma obra ainda “quente do forno”, para usar uma expressão popular, bem ao gosto de Laurentino Gomes.
Em cada volume, ele dá uma breve sinopse na contracapa, de que vão aqui pequenos tópicos, em ordem sequencial:
“Maior território escravocrata do hemisfério ocidental, o Brasil recebeu cerca de 5 milhões de cativos africanos, 40% do total de 12,5 milhões embarcados para a América ao longo de três séculos e meio. Como resultado, o país tem hoje a maior população negra do planeta, com exceção apenas da Nigéria. (...) Nenhum outro assunto é tão importante e tão definidor da nossa identidade nacional”.
“O agitado e rebelde século XVIII e a gigantesca onda africana que o marcou são os temas do segundo volume sobre a história da escravidão no Brasil.
“Na tarde em que o príncipe Dom Pedro chegou às margens do Ipiranga, em 7 de setembro de 1822, (...) comprar e vender gente era o maior negócio do novo país independente.”
Vale a pena ler Laurentino Gomes: ele não deixa ninguém de fora de nossa história!
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
Do mesmo autor, leia outro texto AQUI