O Manik saiu de Bangladesh a pé, atravessou a Índia, o Paquistão, o Tajiquistão, o Uzbequistão, o Cazaquistão, todos esses países aí que o cara pensa bá!
Na Rússia foi preso.
Eu sou apenas um bengalês, dizia o Manik. Tenho mulher e quatro filhos.
E os russos ali: que que esse indiano tá falando?
Até que ele atinou de dizer que queria ir pra Itália. Que tinha entrado na Rússia porque queria ir pra Itália. E ficou repetindo Itália Itália até que os russos disseram tá tá.
Lá foi o Manik, sempre a pezito, cruzando a Ucrânia, a Moldávia, a Romênia, a Hungria, a Croácia, a Eslovênia, todos esses países aí que o cara pensa bom, pelo menos eles de vez em quando jogam a Copa.
Chegou na Itália, o Manik, exatamente quatro meses e vinte dias depois de sair de Bangladesh. Provou que quem tem boca vai a Roma – e quem tem perna vai aonde quiser, inclusive Roma.
Arrumou emprego num restaurante do centro. Só cliente de gabarito. Daí o patrão, o italiano, diz ele pro Manik: nada de meter esse carão pra fora da cozinha. Que senão ia espantar os surfistas da Austrália, as escritoras americanas, os gerentes japoneses.
Um ano depois, o Manik mandou os fiorin pro filho mais velho em Bangladesh: pode vim.
Levou só dois meses, o Rimon, porque não precisou ir a pé, nem passou pela Rússia.
Ah, porque o pai é cozinheiro, daí eu vou ser garçom, pensou o Rimon. Mas o dono, o italiano, ele só olhou assim pro guri e disse nem te inventa de aparecer no salão, que eu não quero ver ninguém espantando as cineastas francesas, os cientistas alemães.
Ficaram os dois bengaleses na cozinha.
O garçom ficou sendo um brasileiro, que falava inglês com um sotaque tão ruim quanto os italianos e era até mais branco do que o necessário para os padrões daquela tradicional trattoria.
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.
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