As transformações abruptas que vieram com a pandemia, a partir de março de 2020, alteraram as formas de trabalho para muitos profissionais. Não se sabe se serão momentâneas ou não, mas houve a possibilidade de ampliação de alternativas frente ao contexto vigente com a Covid-19. Do coworking ao home office, muitas pessoas tiveram de assumir novas formas de realizar as suas atividades.
O varejo, considerado um dos setores que mais demandam por inovações devido ao relacionamento direto com os consumidores, carece de novos formatos de loja, que permitam vivências e formas de trabalho diferenciadas.
As exigências e também as oportunidades do momento propiciam novas configurações de muitas ideias, ações, processos já existentes, transformando-se em atos de criatividade. Caracterizado como um setor extremamente dinâmico, de mudanças constantes, o varejo apresenta tendências que devem ser consideradas pelo gestor contemporâneo no planejamento de suas estratégias competitivas neste momento de pandemia, ainda de um modo mais crucial.
O fenômeno coworking surge de novos formatos das relações de trabalho, propiciadas com o desenvolvimento de avanços tecnológicos que permitem o fenômeno da execução do trabalho a distância. Não se trata apenas de uma partilha de um espaço físico, mas também possibilita o desenvolvimento e o estabelecimento de uma comunidade de pessoas de pensamento similar que compartilham os mesmos valores, criando sinergias.
É o reflexo dos novos valores do mundo contemporâneo. O ser humano, sendo um ser social, em algumas circunstâncias precisa da interação social, intermediado pela comunicação oral. Qual espaço varejista poderia, então, propiciar esses encontros? A resposta é o coworking.
O coworking spaces (CWS) tem como propósito o compartilhamento de estrutura física, mobiliário, custos de locação, serviços de telefonia, internet e secretaria, bem como de um endereço comercial, gerando um ambiente propício ao networking, à troca de experiências, ao compartilhamento de conhecimentos, à participação de eventos e a programas de capacitação.
Quando se trabalha em casa, por exemplo, a pessoa acaba, com o passar do tempo, perdendo suas habilidades sociais, seu equilíbrio, suas conexões. Ela percebe que está perdendo “sua tribo”, aquela que tinha na faculdade ou quando trabalhava fora de casa.
Neste contexto, revela-se um perfil multifuncional, tanto do novo varejo quanto do novo consumidor, que busca unir, em um mesmo ambiente, cultura, entretenimento, formas de compartilhar experiências e trabalho. Existem grupos de profissionais motivados pela ideia de sair do ambiente institucional para frequentar locais de varejo alternativos, cujo formato permite a interlocução de assuntos referentes a trabalho, pesquisa etc.
Os CWS estão sendo percebidos como um novo “Third place” para se trabalhar, uma vez que escritórios dentro de empresas seriam “os primeiros”, os home-offices seriam “os segundos” e locais públicos como livrarias, cafés e bibliotecas são os atuais “terceiros espaços” – que reúnem profissionais independentes, micronegócios e startups, sendo uma solução para espaços profissionais de trabalho, principalmente para jovens empreendedores.
O antropólogo brasileiro Roberto DaMatta divide a vida social brasileira em três espaços essenciais: o universo da casa, do lar e do trabalho. E observa-se, nas cidades brasileiras, um nítido movimento: do trabalho para casa, de casa para o trabalho. A ‘casa’ e a ‘rua’ são categorias sociológicas para os brasileiros.
Estas palavras não designam simplesmente espaços geográficos ou coisas físicas comensuráveis, mas, acima de tudo, entidade moral, domínios culturais institucionalizados e, por causa disso, capazes de despertar emoções, reações, leis, orações, músicas e imagens esteticamente emolduradas e inspiradas.
Mesmo cada espaço tendo suas características, existe uma linha tênue entre eles. Hoje, tais limites tornam-se invisíveis, uma vez que leva-se trabalho para casa, a rua é lugar de trabalho e as relações de casa permeiam a rua e o trabalho. As relações e os espaços não possuem mais fronteiras, as pessoas clamam por qualidade de vida, trabalhar naquilo que gostam, fazer das cidades lugares de bem viver. Surge, nessa perspectiva, a difusão da casa, da rua e do trabalho, emergindo espaços multifuncionais.
Estas constatações envolvem premissas que se visualizam como alvissareiras num futuro próximo e que se desvanecem, desmancham no ar, com o advento de algo tão inesperado e insuspeitado como a pandemia provocada pelo coronavírus.A realidade antevista relacionada ao coworking voltará? Ela se configura momentaneamente como impossível. Como as pessoas seguirão trabalhando?
O home office, realidade atual do trabalho de grande parte da massa trabalhadora, já desponta como um futuro consistente, a concorrer e também se aliar com a modalidade presencial, mesmo pós-Covid.
Diante de tantas incertezas e a necessidade de se reinventar o negócio, o coworking deverá passar por transformações. É uma solução que faz muito sentido e agora ainda mais, porque as empresas estão vendo que o trabalho remoto é viável.
O teletrabalho consiste em atividade profissional que é realizada fora do ambiente da empresa empregadora e auxiliado por tecnologia de transmissão de dados. Esta realidade teve de, no transcurso da pandemia, ser assumida de maneira atribulada: requeria celeridade e não teve o tempo necessário ao devido planejamento. Está se construindo ao mesmo tempo em que é exigida, o que trouxe pontos para se refletir e propor ajustes para os passos vindouros.
Portanto, poderá surgir um novo público para os espaços de coworking, formado por aquelas empresas que nem cogitavam a ideia de não ter um escritório próprio, mas que, devido aos altos custos e à crise instaurada pela Covid-19, serão obrigadas a desistir desse formato padrão. Os empresários vão refletir muito antes de entrar em contratos de longo prazo e irão procurar soluções mais flexíveis, como os espaços coworking.
Outra percepção é que, após a pandemia, as empresas de grandes centros adotarão novas formas de trabalho e uma das tendências é o “close to home”, trabalhar perto de casa para diminuir deslocamentos de seus colaboradores. Além disso, o coworking também será uma alternativa para proprietários de imóveis ociosos que precisarem rentabilizá-los, no período que virá pós pandemia.
Por toda a experiência vivenciada, a tendência é que as pessoas retornem ao trabalho ainda mais carentes por interações com colegas, clientes, enfim, necessidade de se relacionar e trocar ideias e sentimentos. Os coworkings são uma ótima opção nesse sentido, tornando-se, claro, o ambiente físico seguro.
Entretanto, será preciso investir em tecnologias de baixo contato, como portas e dispensers automáticos, sensores nos ambientes, além de todos os equipamentos de segurança que fazem parte dos protocolos da Organização Mundial da Saúde, distanciamento mínimo pré-determinado, uso de máscaras, painéis de separação em acrílico, entre outros.
Estas constatações induzem a refletir sobre a relação do tema central do estudo deste ensaio: o coworking como a nova modalidade de teletrabalho, que deve permanecer pós-Covid e terá de se reconfigurar.
Tem-se três pontos identificados que necessitam se reinventar, se reconfigurar: lojas de varejo, coworking e teletrabalho, sem usar o termo home office, pois não necessariamente será no home-lar das pessoas, este home pode tomar novas configurações. Quem sabe em espaços de varejo que precisam também se reinventar?
Esta reflexão é parte de estudos conduzidos pelo grupo de pesquisa Pense Marketing, formado pelas professoras:
Lurdes Marlene Seide Froemming (na foto) - administradora, doutora em Marketing
Simone Nunes Ceretta - administradora, mestre em Desenvolvimento Regional
Márcia Almeida - publicitária, mestre em Desenvolvimento Regional