“A rotina é o hábito de renunciar a pensar”. (José Ingenieros (1877 – 1925), autor do livro “O Homem Medíocre”)
Estimado(a) leitor(a), na última oportunidade foi evidenciado de maneira genérica o preocupante desafio que o Brasil possui em termos de Educação em seus mais diversos níveis. Somado a isso, nos últimos dias, principalmente com a proximidade das Eleições Municipais (15 de novembro e 28 de novembro para eventual segundo turno), já é possível ver a divulgação de nomes que postulam como os cargos eletivos tanto para prefeito e vice, como para vereador na condição de “candidato(a)”.
Como curiosidade rápida, essa palavra provém do latim candidatus, que condiz com alguém que veste o alvo, o branco. Essa escolha da cor se justifica por vincular a figura do postulante à ideia de pureza e honradez que lhe simboliza.
Ao mesmo tempo, na contemporaneidade, um dos inúmeros desafios impostos aos gestores públicos condiz com aspectos que abrangem a manutenção da “máquina pública”, ao cuidado para com o meio ambiente e ações que fomentem a economia local. Entretanto, qualquer que seja a situação dos temas anteriores, entende-se que o que mais se destaca e está interrelacionado a eles condiz com o aspecto social.
Nessa linha, a Confederação Nacional dos Municípios disponibiliza dados dos 5.567 municípios a partir de sua relação com a Agenda 2030 (http://ods.cnm.org.br/), estabelecida pela Organização das Nações Unidas – ONU, sendo os dados, mesmo que de maneira genérica, objeto de explanação nesse espaço em um momento anterior (Dezessete desafios para proteger o planeta e preservar a humanidade, 02/07/2020).
Em razão de se estar próximo deste período eleitoral, a dimensão social analisada pela CMN possui 13 temas condizentes ao cotidiano de todos, sendo que, de uma maneira ou de outra, eles interferem nas condições diárias do leitor, da sua família, do seu bairro e do seu município.
Deste modo, entre os anos de 2017 e 2019, tem-se a seguir os resultados de indicadores sociais informados no site da CMN e que mostram pontos positivos e outros que, desde logo, impõem desafios aos futuros ocupantes dos poderes legislativo e executivo de Caxias do Sul.
No que diz respeito aos destaques exitosos, quatro deles podem ser evidenciados. Em outras palavras, tem-se a redução da Mortalidade Infantil (+41,40%), seguido da melhora no Índice de mortes por abuso de álcool e outras drogas (+23%), uma menor Taxa de homicídio de mulheres (+29,40%) e a redução na taxa de Abandono Escolar até o 9º ano (+4,5%). Como índice neutro, ou seja, sem melhora ou piora no período citado acima, está o índice de Nascidos Vivos com Baixo Peso (0,0%).
Na continuidade, os demais aspectos revelam que, mesmo sendo o segundo maior município do RS (517.451 habitantes, IBGE Cidades, 2020), Caxias do Sul também apresenta oito temas que, mesmo podendo ser observados em separado ou por blocos, todos revelam desafios nas áreas transversais e comuns para qualquer que seja o indivíduo, seja ele gestor público ou munícipe.
Deste modo, quando se observa que o município registrou um decréscimo na proporção de pessoas vivendo em extrema pobreza (-2,0%), este item revela que a desigualdade social suscita um desafio público, em especial porque este registro demonstra que mais pessoas passaram a ter mais dificuldades de manter tanto sua própria subsistência como de sua família.
Trata-se de uma herança histórica que até os dias atuais o Brasil ainda não conseguiu equalizar, muito em razão da formação de sua complexa organização social e política (como sugestão, leia os livros “História do Brasil” de Boris Fausto, Editora Edusp, 2012 e “Brasil: Uma Biografia” de Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Murgel Starling, Editora Companhia das Letras, 2015).
Se observado individualmente cada ano-base, a taxa de pessoas nessa condição era, em 2017, de 2,75%; em 2018 com 3,14% e, no ano de 2019, com um registro mais alto: 3,25%. Pode parecer pouco, mas, ao se considerar este último, de cada 100 pessoas, isso significa que, no mínimo, três delas agora não têm as mesmas condições de antes ou, ainda, podem ter chegado ao município ou perdido o emprego. Nessa situação, a fim de viver, como um dos tantos exemplos possíveis, passam a aceitar subempregos que agravam essa situação de desigualdade social.
Além disso, é importante ressaltar que, segundo dados do IBGE (2019), o Brasil possui cerca de 13,5 milhões de pessoas que sobrevivem com até 145 reais mensais, ao passo que o número de miseráveis vem crescendo desde 2015 no plano nacional, algo que não é diferente em Caxias do Sul, como evidenciado.
Em outro aspecto essencial para a população, os dados da CMN indicam que a Taxa de Homicídios por 100 mil habitantes no município registrou uma retração (-23,90%) se comparado o período 2017-2019, o que sugere que a violência e os homicídios também exigem cada vez mais ações efetivas e em conjunto com outros órgãos para a minimização deste problema social, sendo que, para muitos, a solução seja o crime (como sugestão deste item, assista “Ônibus 174”, de José Padilha, 2002 ou “Carandiru” de Hector Babenco, 2003).
Ainda no que diz respeito à garantia da vida, os dados acessados mostram que a Taxa de Óbitos Maternos, ou seja, o número de falecimentos por parte do gênero feminino em razão de causas maternas, por 100 mil nascidos vivos também se mostrou negativo (-22,6%). Cabe aqui ressaltar que a necessidade de oferecer boas condições de vida traduz a saúde plena de uma pessoa, o que engloba alimentação, acompanhamento pré-natal, a fim de prevenir problemas que podem acarretar na mãe do recém-nascido, como por exemplo, pré-eclâmpsia, hemorragia, infecções e abortos provocados (dentre tantos filmes sobre o tema, sugere-se o argentino “Invisível”, de Pablo Giorgelli, 2017).
Como destaque ainda no plano nacional, dados do Ministério da Saúde revelam que, entre 1990 e 2017, a mortalidade materna sofreu uma redução de 55%. No entanto, os números mostram que o índice voltou a crescer lentamente desde 2013, passando de 62,1 para 64,5 óbitos maternos a cada 100 mil nascidos vivos, em 2017. Como destaque, a Região Sul é aquela que apresenta a menor taxa (36,8) na proporção de referência.
O último tema dos indicadores sociais que resultaram em dados negativos em Caxias do Sul entre 2017 e 2019 diz respeito à Educação. Uma vez observado o índice de aprendizado adequado até o quinto ano em Matemática, evidencia-se um primeiro resultado preocupante (-3,4%). Na continuidade deste mesmo nível de instrução, ele se mostra mais intenso quando verificada a retração quanto ao aprendizado em Português (-11,1%).
Deste modo, pode-se considerar que nem todas as crianças que frequentavam até o quinto ano fundamental nas escolas do município caxiense conseguiram aplicar a capacidade de trabalhar com operações de soma, multiplicação, divisão ou subtração quanto à leitura e à interpretação de textos. Ou seja, esses e outros temas eram complexos para elas.
Ainda nesse nível, a taxa de abandono escolar registrada nos anos iniciais (entre o 1º e o 5º ano) fora de -2,8%. Com isso, de modo geral, em cada 100 alunos, no mínimo dois abandonaram a escola no período analisado. A consequência pode ser o primeiro item negativo citado: a extrema pobreza, que é enfatizada pela vulnerabilidade (foco de discussão futura nesta coluna).
A última parte dos indicadores de Educação em Caxias do Sul se concentra na outra parte, que corresponde ao término do Ensino Fundamental (até o 9º Ano). Nesse sentido, não apenas as áreas do conhecimento se invertem em termos de dificuldade, como os percentuais aumentam. Isto porque, quando se observa a parte do Português, tem-se um resultado negativo de -16,20% ao passo que, em Matemática, se registrou um percentual de piora na casa de -26,30%. Em outras palavras, de cada 100 estudantes no Ensino Fundamental entre o 6º e o 9º ano, no mínimo 16 pessoas tinham dificuldades em Português e 26 ou mais delas, em Matemática.
Isso expressa que esse estudante, logo mais adiante, irá ingressar no mercado de trabalho, sendo ocupante de cargos que, por ora, não exigem tanta complexidade em suas decisões, mesmo ainda se observando uma crescente demanda pela Educação aliada à Tecnologia. Essa rotina se faz necessária em ser alterada. Por isso, como sugestão adicional, acesse a palestra da Profa. Dra. Claudia Costin, da Fundação Getúlio Vargas – FGV, pelo link https://youtu.be/0QSSMcSOdb4.
Nota-se que, se considerados os treze indicadores citados, a situação que se refere à realidade caxiense na parte social apresentou melhora em quatro delas, com uma categoria sem avanço ou piora e oito delas com resultados negativos. No final, os dados da CNM revelam que essa categoria social deteve um percentual de piora de -30,03%.
Entende-se que são muitos os desafios que se apresentam para os que forem eleitos pelo povo caxiense. A necessidade de pensar em uma maior participação da população nas atividades que englobam aspectos sociais como a diminuição da pobreza, melhora na saúde, na segurança e na educação são temas não apenas amplos como complexos. Mesmo assim, o que fora exposto aqui brevemente pode servir de subsídio para que você, eleitor(a), possa ter maiores dados básicos a fim de não ser pego(a) desprevenido(a) ante qualquer informação falsa ou distorcida.
Tal como observa Bernardo Klinksberg (2003), a cidadania pode expressar sua inconformidade por diversas vias. Seja pela falta de confiança nos representantes públicos ou não comparecimento às urnas (mesmo o voto sendo obrigatório entre 18 e 70 anos) ou ainda pela perda de legitimidade de inúmeras instituições básicas da sociedade frente a tantas denúncias de mau uso do dinheiro público, aliado à impunidade ou ao abrandamento de eventuais penas.
Desta forma, você que já tem ou terá contato com os candidatos, questione se ele tem conhecimento destes e de outros dados condizentes à realidade local. Ao mesmo tempo, verifique qual é o grau de conhecimento que ele possui sobre a Lei Orgânica do Município, quais são as prioridades dele(a) a partir de suas propostas (e qual base é usada para tanto), se ele(a) sabe o que são os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) ou como se dá o funcionamento da Câmara de Vereadores com a Prefeitura e a Sociedade, dentre tantos outros itens possíveis (e necessários) para realmente eleger o representante municipal.
Em outras palavras, deve-se evitar o Efeito Halo – termo cunhado pelo psicólogo Edward Lee Thorndike (1874 – 1949) durante testes feitos na Primeira Guerra Mundial sobre a razão de escolha dos comandantes que preferiam soldados fortes ou com melhor postura. Nessa linha, no plano eleitoral, pode-se observar que, por vezes, uma qualidade secundária ou até mesmo terciária, como por exemplo, a beleza, o status social ou a idade, pode produzir uma impressão positiva ou negativa que “ofusca” o objetivo principal. Com isso, escolhe-se o(a) candidato(a) por ser considerada uma pessoa atraente ou porque “é atencioso ou querido”. Entende-se que essa é outra rotina que demanda novos pensamentos e atitudes, principalmente por se tratar de gestores que irão administrar o dinheiro público e elaborar/executar políticas públicas nas mais diversas áreas.
Como citado no início do texto, evite a acomodação, opere de tal maneira que sua ação gere resultados diferentes de até então e condizentes com sua realidade. Que este pequeno momento de leitura tenha conseguido lhe proporcionar uma reflexão mais aprofundada e que possa lhe ajudar a melhor escolher os representantes do próximo pleito.
Em oportunidade futura, serão expostos os indicadores no campo institucional entre 2017 e 2019, assim como a divulgação de alguns mecanismos de Controle Social que podem ser consultados pela população, mas que talvez não tenham sido ainda plenamente divulgados. Até lá.
Marcos Paulo Dhein Griebeler é Doutor em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Professor do Centro de Negócios do Centro Universitário da Serra Gaúcha – FSG e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional das Faculdades Integradas de Taquara – FACCAT.
marcos.griebeler@fsg.edu.br ou marcosdhein@faccat.br
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