Ficar de frente para o espelho e não ver nossa imagem refletida! É isso que nós, pessoas com deficiência, sentimos quando não somos representadas. Quando não temos aquela sensação de pertencimento em filmes, peças publicitárias, novelas, séries etc.
O Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (3/12) traz essa reflexão sobre como podemos aumentar nossa representatividade neste planeta que acaba de chegar aos 8 bilhões de pessoas, de acordo com um relatório da ONU (Organização das Nações Unidas).
Portanto, em algum momento da vida, vamos passar por uma pessoa com deficiência. Dados não atuais, também da ONU, indicam que o mundo tem 1 bilhão de pessoas com deficiência, o que representa 12,5% da população total. Uma parcela significante e que vem crescendo como consumidora e como força de trabalho atuante e produtiva.
A falta de representatividade contribui para o aumento da invisibilidade das pessoas com deficiência na sociedade. Sem representatividade, nossas questões acabam ficando bem longe das prioridades das políticas públicas, dos projetos e ações que podem trazer mais qualidade de vida e de inclusão.
Em uma pesquisa realizada pela Getty Images e YouGov, com mais de 5 mil participantes de 26 países, mais de 60% das pessoas entrevistadas se sentem discriminadas por comerciais.
Por isso, quando uma marca, um produto, um serviço se comunica com a pessoa com deficiência, automaticamente nos torna mais presentes de fato na sociedade, considera e respeita a nossa existência. Cada vez mais é papel das empresas, governos, sociedade contribuir para a mudança desse cenário e retratar a nossa diversidade real, sem deixar ninguém de fora.
Quando deparamos com uma novela, em horário nobre e que pela primeira vez traz para a trama uma atriz de fato com deficiência, como é a dra. Juliana, da novela “Travessia”, de Gloria Perez, brilhantemente interpretada pela atriz, consultora, especialista e influencer de inclusão da pessoa com deficiência Tabata Contri, é motivo para comemorar.
Quem trabalha com inclusão de diversidades não deixou passar desapercebida essa evolução de representatividade. Tabata nos representa não só porque vem ajudando a construir os melhores caminhos para a inclusão - alguns até ela mesma criou - mas porque também nos representa como o ser humano que é e que deu um grande exemplo de aonde nossos sonhos podem nos levar, com ou sem deficiência.
A importância de ver nas telas as dificuldades que enfrentamos ao sair de casa e, ao mesmo tempo, o quanto somos capazes de realizar, estudar, trabalhar, socializar e atuar no ofício que desejarmos conta e muito. Contribui para aflorar nosso pertencimento a cenários nada acostumados com nossas presenças. Também colabora para reforçar que somos potências e nenhuma opressão capacitista deve frear nossas conquistas e nossa vontade de ir cada vez mais longe.
Que Tabata Contri e sua Juliana coloquem de vez um ponto final no 'cripface', prática em que personagens com deficiência são interpretados por atores sem deficiência nos filmes, novelas, publicidades etc. Isso, além de atrapalhar os caminhos da inclusão, distorce a realidade e dificulta a geração de novos talentos nas artes.
Que a história de Juliana dê o recado de inclusão necessário e urgente, que passe bem longe daquelas histórias clichês que exageram no tom desafinado de superação, que aliás abominamos, e que mostrem a vida da pessoa com deficiência como ela é. Porque o sinônimo de final feliz para nós está ligado à representatividade de existir e realizar. Que assim seja com Juliana por Tabata. Oh Glória...
Carolina Ignarra é CEO e fundadora da Talento Incluir, consultoria que já incluiu mais de 8 mil profissionais com deficiência no mercado de trabalho. É influencer do LinkedIn e está entre as 20 mulheres mais poderosas do Brasil da revista Forbes em 2020.