No final da década de 1990, o fundador e então CEO da Amazon, Jeff Bezos, cunhou uma frase que, para mim, foi fundamental na estratégia da companhia: "We will leverage our own assets" - "vamos alavancar nossos próprios ativos", na tradução literal para o português.
Vale relembrar que a empresa começou vendendo livros na internet e hoje esse item tem uma participação ínfima da sua receita. Mas por que essa escolha, quando toda a internet estava apenas começando e disponível? Na cabeça de Jeff, uma livraria virtual teria vantagens que uma loja física nunca conseguiria suportar. Em hipótese alguma uma loja teria mais variedade do que o site da Amazon.
Hoje, a maior livraria do mundo tem cerca de um milhão de livros (a plataforma do e-commerce americano conta com aproximadamente 33 milhões). O melhor livreiro não conseguiria lembrar de todos os títulos sobre um assunto e nem saberia dizer todos os livros em que o pesquisador Jacques Cousteau é mencionado, por exemplo. Por outro lado, o sistema digital permite que o consumidor obtenha respostas em poucos segundos, com apenas alguns cliques.
Para mim, aquela frase continua tão estratégica quanto há 20 anos, e acredito que podemos aplicar esse lema em outros tipos de negócios. No caso de uma franquia, como ela pode se alavancar em seus ativos?
Algumas características são muito presentes na operação de uma franquia. Por exemplo, com o apoio da marca, o lojista tem à sua disposição muito conteúdo sobre os seus produtos. Portanto, ninguém está mais qualificado para treinar seus vendedores e dar a eles argumentos de venda.
É fundamental usar esse arsenal para converter em vendas. Não se tem ideia, mas a construção de conteúdo, como cadastro, descrição e fotos dos produtos é uma das partes mais caras da operação de uma loja virtual e também mais sensíveis à eficiência de venda. Um vendedor munido com esses argumentos de venda tem muito mais chances de conversão, seja em uma visita física à loja ou em um contato digital com um cliente.
Outro ponto importante em que o lojista pode se diferenciar é no conhecimento da sua base. O e-commerce, por exemplo, consegue medir muito a interação com os usuários na navegação prevista, mas ele não consegue capturar qualquer valor quando algo foge do esperado. Na loja física, você tem a atenção total do consumidor e uma oportunidade única de capturar informação dele.
Você consegue saber se aquela compra é para ele ou um presente para a sobrinha, se ele está se preparando para uma viagem ou se é uma roupa para comemorar algo. Todos esses são exemplos de insights incríveis para a conversão de vendas. É possível até capturar as sazonalidades específicas de cada cliente e entregar essa inteligência para direcionar venda e engajamento.
Além disso, outra estratégia pouco explorada é conhecer melhor o público ao redor do estabelecimento. Caso a loja fique dentro de um shopping, é possível se beneficiar utilizando informações para contatos e ações de marketing ainda mais assertivas.
Uma loja física deve dominar a sua zona primária e secundária de influência. Por isso, é natural esperar que as pessoas que consumam na sua loja morem ou trabalhem perto dela. Um shopping tem em média o cadastro de 200 mil clientes. Esses dados são ouro para a sua loja, então, procure o marketing do mall e monte uma estratégia para divulgar seus produtos. Todos têm a ganhar.
Em resumo, dedique-se a qualificar seu time de vendas com conteúdo relevante, conheça a sua base de clientes e transforme, com tecnologia, esse conhecimento em vendas e engajamento. Nunca, nenhuma experiência digital vai conseguir replicar isso. Leverage our own assets.
Raphael Carvalho é formado em engenharia na PUC-Rio e CEO da Spot Metrics.