Sílvio Castro, com densa atividade no campo da literatura – como poeta, romancista, ensaísta, crítico literário e professor universitário –, tem um nome pouco lembrado. Nasceu em Laranjeiras, no estado do Rio de Janeiro, em 1931, e faleceu em Veneza em 2014, cidade onde vivia desde 1962, quando foi titular da cátedra de Literatura Portuguesa e Literatura Brasileira na Universidade de Pádua.
Por ocasião do Centenário da Imigração Italiana, ocorrido em 1975, a UCS estabeleceu relações com a Universidade de Pádua para a realização de pesquisas e estudos em conjunto sobre essa página da história. O marco principal foi a criação do Instituto Superior Brasileiro Italiano de Estudos e pesquisas – Isbiep, dentro do qual nasceu o Projeto Ecirs e que, mais tarde, passou a ser denominado Instituto Memória Histórica e Cultural – IMHC, como continua sendo chamado.
Diversos projetos e várias publicações resultaram desse intercâmbio, que se mostrou fecundo. Foi nessa oportunidade que um professor da Universidade de Pádua, ao conhecer a língua construída aqui pelos imigrantes, afirmou que não se tratava de um dialeto, mas de uma “nova língua neolatina”, a que hoje é reconhecida como Talian.
Nesse contexto foi que Sílvio Castro travou também suas relações com a UCS. Na época, estava ele organizando a obra História da Literatura Brasileira, editada em Lisboa em 1999, pela Publicações Alfa, em três volumes de meio milhar de páginas cada um. É uma obra escrita a muitas mãos, buscando sempre relacionar a literatura com o contexto histórico e cultural do Brasil.
Foi para colaborar com esse gigantesco projeto que ele me convidou, junto com meu colega Jayme Paviani, para escrevermos um capítulo sobre a relação entre “Catolicismo e Literatura no Brasil Pré-Modernista”. Lá está essa contribuição no Capítulo 36 do Volume 2, passando em revista desde os padres Anchieta e Vieira até Tristão de Ataíde, Jorge de Lima e Murilo Mendes.
Pessoa muito cordial, Sílvio Castro fazia questão de manter relações até mesmo de âmbito familiar. Num desses encontros, contou um episódio ocorrido com seu gato em Veneza. Depois de conseguir um local que pesava menos no bolso, decidiu mudar de residência. Levou todos os pertences, a maior parte livros, e junto o gato que morava com ele. Na manhã seguinte, na casa nova, não viu mais o gato. Procurou pelos cantos, e nada. Então lhe veio uma ideia na cabeça, “uma ideia de gato”, segundo ele. Saiu e foi até onde morava antes e, confirmando a expectativa, lá estava o gato. Ele havia voltado para a casa que era seu reino, recusando viver no exílio. E por mais que Sílvio tentasse atraí-lo para a nova moradia, não conseguiu fazer o gato mudar de ideia.
Sem o gato para dividir o tempo com ele, Sílvio Castro concentrou-se ainda mais nos livros de literatura que têm uma virtude especial:
- Os livros não fogem de casa! E gostam de afagos! – concluiu ele.
Por causa dessa visão, o legado de Sílvio Castro é de grande valor, embora pouco lembrado. Além da já citada História da Literatura Brasileira, sua obra mais divulgada é Memorial do Paraíso – O romance do descobrimento do Brasil (1998) reconstituindo o cenário da “Carta de Pero Vaz de Caminha” ao rei Dom Manuel. Carta que é um verdadeiro poema desenhando cenários e horizontes do novo mundo descoberto.
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
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