Um dos mistérios que demorei a decifrar, quando cheguei em Caxias do Sul para fazer meus estudos, foi o do significado de Forqueta, nome de um lugar que volta e meia aparecia nas conversas com os colegas. Nenhum deles sabia de onde vinha esse nome. Eu imaginei que seria um diminutivo de “forca”, aquele instrumento que executou Tiradentes. Mas nenhum livro de história falava do uso de forca nas vizinhanças.
Foi preciso enveredar no estudo da língua italiana para descobrir que forchetta significa garfo: “um talher em geral feito de metal, formado por um cabo e diversos dentes, com que se pega a comida”, reza um dicionário. A história registra que o uso de talheres teve incremento na França do século 17, e de lá se espalhou pela Europa, como uma forma de elegância no comer.
Existe um episódio jocoso, não se sabe se inventado, sobre a ida dos talheres para a Itália, levados por um duque da família Médici. Ele convocou a nobreza de Florença para um jantar, exibiu a novidade e ensinou como usar garfo, faca e colher. Iniciado o jantar, todos se esforçaram para juntar a comida com o garfo. Quando se deram conta, o anfitrião continuava pegando a comida no prato com os três dedos da mão direita. Diante do ar de espanto dos convivas, ele teria dito: “Eu sou um Médici, eu como do jeito que eu gosto!”
Pois bem, quando vieram os imigrantes italianos, trouxeram junto a palavra forchetta, com o sentido de garfo. Mas depois fiquei sabendo, de uma forquetense famosa, uma outra versão: a de que forchetta era um tipo de pente usado pelas mulheres, conhecido como “prendedor de cabelo”.
Mas a forma do garfo, ou do pente, serviu de inspiração para dar o nome de Forqueta a lugares onde houvesse uma confluência de acessos, pela terra ou pela água.
A primeira localidade a adotar o nome de Forqueta foi no encontro do Rio Caí com o Arroio do Ouro, em Nova Palmira, situada no hoje distrito de Vila Cristina, de Caxias do Sul. Neste caso, o nome foi dado por ser sinônimo de forquilha, como consta no Dicionário Houaiss, vocábulo da língua portuguesa datado de 1683. Hoje, para diferençá-la da Forqueta do alto da serra, ganhou o nome de Forqueta Baixa.
Já o nome da Forqueta de cima da serra foi uma escolha dos seus moradores, pelo fato de o local ter um entroncamento de estradas, sugerindo a forma do garfo. O cabo do garfo era a estrada de Caxias até aquele ponto. Os dentes do garfo eram as estradas para várias sedes de colônias: Nova Trento, Nova Vicenza, Nova Milano, Dona Isabel, Conde d’Eu e, na baixada da serra, Nova Palmira.
Essa confluência de caminhos fez de Forqueta uma “pequena capital”, que recebeu uma estação de trem, quando Borges de Medeiros ligou Porto Alegre a Caxias com a estrada de ferro, em 1910. E quando o mesmo Borges de Medeiros criou o programa de produção de vinho nas colônias italianas, Forqueta se tornou a sede da primeira Cooperativa Vitivinícola, não apenas da Serra Gaúcha, mas também do Estado e do Brasil.
Com a abertura de vias asfaltadas passando ao largo da vila, e depois com a desativação da via férrea, Forqueta foi perdendo espaço para outras sedes da região. Mas as marcas de seu brilhante passado ainda estão bem visíveis. A marca que ficou em mim foi a de ter ido pela primeira vez a uma festa de capela, próxima da vila, quando conheci a deliciosa sopa de anholine...
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
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