Caxias do Sul 22/11/2024

O causo do cartório

Em que as agruras na hora de registrar um filho geram problemas inomináveis
Produzido por Paulo Damin, 16/09/2024 às 08:31:20
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul
Foto: ARQUIVO PESSOAL

No interior, antigamente, eles deixavam acumular uns três quatro filhos pra ir registrar tudo duma vez. Ficavam daí os filhos com o mesmo aniversário. Carneavam um galo só por ano, economizavam nas palmas do parabéns.

Aí tinha um lá que – sabe a história da Tracaliana? Que o homem chegou e o cara do cartório pediu: que nome vai ser? E o homem: sei lá, traca Liana!

Bueno.

Lá pra fora tinha o Hildo. Um dia a mãe dele engravidou de novo e o pai foi registrar.

– Qual o nome do teu filho? – diz o cara do cartório.

– Hildo – diz o homem, na inocência.

Mas não é que o cara do cartório registrou o recém-nascido como Hildo também?

Precisava ver a cara daquela mulher quando que o marido chegou em casa com a certidão.

– Hildo de novo? – diz ela – Mas o que que você tem na cabeça, Maquiné!

E ele, com aquela laje:

– Mas o cara pediu o nome do meu filho…

Daí ele foi de volta pro cartório, um dia inteiro a pé até a cidade.

– Você botou o nome errado – diz.

E o cara do cartório:

– Mas não era pra ser Hildo?

– Não – diz o homem – Esse aí eu já tinha.

– Bom – diz o cara do cartório – Agora você tem dois.

– Mas eu quero trocar o nome.

– Hildo não tá bom?

– Sim – diz o homem –. Mas só um, não dois.

Aí o cara do cartório se enfuriou:

– Olha, seu Maquiné, eu tenho mais o que fazer.

E ficaram nesse impasse. Cada um num canto olhando as moscas que passavam perto.

Quando era hora de fechar, o cara do cartório viu o Maquiné ainda sentado esperando. Diz ele:

– O senhor não me faça mais filho.

E espremeu bem espremido a caneta, fez tipo um N do lado do O na certidão: virou Hildon, o recém-nascido.

Só que na verdade a gente chamava de Hildão o Hildo, que era o mais velho. E o Hildon, o mais novo, todo mundo chamava ele de Hildinho. Mesmo que ele tivesse dois metros de altura, enquanto o Hildão bem dizer não passava de metro e meio.

Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.

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