No capítulo anterior, o Nanico foi com a Veneziana pro Vêneto. Agora ele estava com ela numa bodega, aprendendo que “aperitivo”, naquelas paragens, significava se entortar tomando spritz.
Vendo que a Veneziana era uma tchuquera, o Nanico jogou água nela, pra ela não ficar com dor de cabeça depois. Aí ela voltou a xingar ele de imigrante, o que fez os demais convivas olharem arianamente pro Nanico.
– O que tu veio fazer aqui? – diziam – Quer roubar meu trabalho?
Não esperavam o Nanico responder. Suspeitando que eram um bando de tchuco, o Nanico jogou água neles pra não ficarem com dor de cabeça no dia seguinte…
Correndo dos nativos, o Nanico chegou em Pedavena. Foi no cartório, mandaram ele pra prefeitura. Enquanto esperava ser atendido, calculou que ainda não tinha visto o sol dourado nem o céu azul do País da Cocanha.
Lhe vieram uns versos de Rosalia Calleri:
Sobre a terra o céu
se abaixa com a neblina
e a envolve em denso véu.
Como sombras são as coisas,
como sombras as pessoas
que passam apressadas.
Cada cara mal-humorada
mesmo sem palavras diz:
“Ah, se eu revisse o sol
como eu seria feliz!”
– Falou o cara que veio “dos trópicos” – um funcionário ironizou – Mas tu sabia que nas Grotas faz menos sol do que em Pedavena?
– Como tu sabe de onde eu venho? – perguntou o Nanico.
– Todo dia aparece um de vocês querendo certidão antiga.
Aí o Nanico pediu os documentos do amigo lá que tinha dado carona pra ele no começo da história.
– Qual é o sobrenome? – perguntou o funcionário.
– Bã… – fez o Nanico.
E ficou tentando descrever fisicamente o fulano, mas pro cara da prefeitura não adiantava.
– Tu pegou carona de noite com um desconhecido, mas não fez a única pergunta que importa pra vocês “descendentes de italianos”?
Agora o Nanico, além de fome, sentia humilhação. O funcionário ia sentir pena, mas pensou que aquela era uma boa oportunidade pra desfazer a imagem que as pessoas têm dos vênetos. E decretou:
– Por uma semana, Pedavena vai dar cidadania italiana pra qualquer pessoa que pedir. Avisa teu amigo.
– Tá avisado – disse o Nanico – Estão publicando essa história no portal Silvana Toazza, com certeza ele vai ler.
O que o Nanico não previu é que também os advogados do escritório Chiassi & Fracassi estavam lendo isso…
(Continua...)
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.
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