No capítulo anterior, o Nanico chegou na Itália. Agora ele estava com a profe Leona, no trem pra Pedavena.
Ficou tentando ver alguma coisa através da neblina que embaçava a janela.
– Me avisa se tu enxergar a porca branca – ele disse –. Aquele sonho que eu tive no avião é um presságio.
Então apareceu o cobrador. Vinha pelo corredor, de passageiro em passageiro, conferindo se as passagens tinham sido carimbadas. A Leona cutucou o Nanico. Ele seguia procurando a porca branca no meio da neblina.
– Mostra as passagens pra ele – disse a profe, angustiada.
O Nanico fez uma cara de pena pela Leona. Ela não conseguia entender que já estavam no País da Cocanha?
– Aqui não precisa dessas frescura de passagem – ele explicou.
Aí foi a vez do cobrador fazer cara de pena pela Leona. Quer dizer que aquele ali era o companheiro de viagem dela?
– Só não vou multar vocês porque a senhorita tem cheiro de manjericão – ele disse.
A professora se indignou:
– Prefiro pagar multa do que receber favorzinho machista!
O cobrador não deu bola. Só esperou o trem parar e botou os dois pra fora.
Era uma estação fantasma. Não tinha nem nome naquele prédio velho.
– Tem muita cara de lugar onde uma porca branca moraria – disse o Nanico, espiando pelas venezianas quebradas enquanto a Leona esperneava de raiva contra ele, o cobrador e o patriarcado.
– Olha bem – disse o Nanico –. Se tu fosse uma porca branca, tu não viria aqui com teus filhotes?
Ela voou no pescoço dele.
Quando a Leona cansou de bater no Nanico, ele colocou o maxilar no lugar e comentou que estava na hora da janta. Tinham duas opções: ou ir até o povoado mais próximo, ou esperar pela porca branca.
A Leona nem respondeu. Apenas levantou, foi pegar a mochila e – cadê a mochila?
Já não tinha mais forças pra bater no Nanico. Só sentou e chorou.
Pra consolar a parceira, ele comentou que na Terra da Cocanha não precisavam de mochila. E concluiu declamando uns versos de Carlo Goldoni:
Dois tipos de pessoas tem no mundo:
a que tira do trabalho o seu sustento
e a que trata de comer sem sofrimento.
Quem pensa seriamente fique longe:
aqui só a pessoa que delira
é digna da nossa companhia.
– Que lógica fajuta – roncou alguém atrás dele.
– A porca branca! – disse o Nanico, e a abraçou como se estivesse reencontrando uma amiga querida.
(Continua...)
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.
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