Caxias do Sul 23/11/2024

Nanico no aéreo (Parte II)

Segue a suma saga de Nanico Pipetta, talvez parente de Nanetto, rumo à Itália em busca da cocanha, a bordo de um aeroplano
Produzido por Paulo Damin, 16/02/2024 às 09:19:41
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul
Foto: ARQUIVO PESSOAL

No capítulo anterior, vimos como o Nanico chegou ao aeroporto. Agora ele estava sobrevoando o Atlântico, lambendo os beiços pela lasanha que serviram no avião. Sem falar no vinho: parecia um suquinho, em comparação com o tinto ardido que a família dele fazia na colônia.

O Nanico não tinha nem saído do espaço aéreo brasileiro, mas já se sentia na Terra da Cocanha.

Que poltrona macia – disse ele pro vizinho.

Mas não teve resposta.

Que temperatura amena – insistiu o Nanico.

Mas não teve resposta.

Aí passou a comissária de bordo e explicou que ele tinha de falar italiano.

Porco can – disse o Nanico –. Lá nas Grota só aprendi os palavrão.

Ela fez uma carinha de dó e foi falar com o piloto. Em seguida, ouviu-se uma mensagem:

– Atenção passageiros, é uma emergência. Favor apresentar-se urgentemente alguma profe de italiano.

E foi assim que o Nanico conheceu a Leona. Uma guria com cabelos de espaguete e perfume de manjericão.

A comissária de bordo conduziu o Nanico e a professora até a biblioteca do avião, ao lado dos banheiros, passando uma porta escrita “não entre”. Piscando o olho, a comissária disse:

– Onde vocês acham que a gente aprende a falar tantas línguas? A biblioteca é o segredo dos trabalhadores aéreos.

E declamou uns versos de Alda Merini:

Amor,

voa até mim

com o avião de papel

da minha fantasia

e com o engenho do teu sentimento…

Meio literal demais essa tradução – comentou a profe Leona, e a comissária de bordo foi embora prometendo caprichar mais da próxima vez.

winkwinkwink

A professora começou a aula pelo básico.

– Eu é io. Tu é tu. Ele é lui. Etcétera é eccetera.

E o Nanico foi guardando tudo na cabeçona dele. De olhos fechados e boca aberta, pra fixar melhor a aprendizagem e degustar o perfume de manjericão da Leona.

Basilico… – ele murmurou.

Bravo! – disse a profe, e percebeu que ele estava pegando no sono.

Ela pensou em parar a aula. Só não parou porque viu que o Nanico estava todo arrepiado.

E que ficava mais arrepiado ainda quando ela chegava bem perto do ouvido dele pra ensinar os verbos: o passato remoto do qual ele estava se afastando, o futuro semplice com o qual ele sonhava…

(Continua...)

Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.

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