O cenário pós-pandemia para o varejo físico é desafiador e indica que as transformações no setor continuarão intensas na esteira dos avanços tecnológicos. A inflação pressionada, que afeta a capacidade de consumo da população e encarece as matérias-primas, crescimento do PIB modesto e juros altos, impede que o comércio deslanche.
Entre todas as dificuldades apresentadas aos comerciantes, uma das mais difíceis de administrar cuida do chamado "custo de ocupação", formado pelas despesas com o aluguel e demais encargos locatícios. Diante da atual concorrência com o e-commerce, a localização dos pontos comerciais se mostra ainda mais importante para o sucesso das lojas físicas, isto é, os varejistas precisam instalar suas operações em locais com grande fluxo de consumidores.
Nesse contexto, é natural que os preços dos locativos nessas localidades permaneçam em patamares elevados, muitas vezes incompatíveis com os faturamentos dos estabelecimentos. Além do mais, os reajustes dos aluguéis com base no Índice Geral de Preços (IGP), conferido pela Fundação Getúlio Vargas, a partir do final de 2020 e em 2021, jogaram os valores para as alturas. Em novembro de 2020, por exemplo, o IGP-M atingiu 24,52% em 12 meses e, em maio de 2021, o percentual foi de 37,04%.
Em resumo, observamos hoje, nos principais corredores comerciais e shopping centers, a prática de preços proibitivos, bem como, por consequência, um "entra e sai" constante de lojistas.
Assim, o comerciante precisa equilibrar a proteção do seu ponto comercial atrativo e um custo de ocupação condizente com as suas vendas. Nessa linha, é fundamental manter um bom relacionamento com o seu senhorio, no sentido de facilitar a conclusão de negociações satisfatórias. Ademais, é igualmente importante os lojistas conhecerem os seus direitos, especialmente no que tange às ações renovatórias de contrato de locação e revisional de aluguel.
A ação renovatória é um instrumento crucial para propiciar tratativas balanceadas entre os inquilinos e locadores, uma vez que garante a permanência dos lojistas nos imóveis, além de, como ocorre com a revisional de aluguel, ter a função de fixar os locativos conforme os preços reais e justos de mercado.
Em situação de inadimplência, vale esclarecer que a Lei do Inquilinato confere o direito ao locador de promover a ação de despejo por falta de pagamento, independentemente do valor e dos dias em aberto. Isto é, após um dia de atraso por parte do locatário, o locador já está autorizado a promover a referida demanda desalijatória, bem como exigir todos os encargos da mora (multa, juros etc.). Sob tal ótica, é recomendável que, antes de eventual atraso no pagamento, seja contatado o locador para previamente ser acertada a nova condição de pagamento.
No mais, cumpre informar que a Lei de Locações permite que o inquilino, depois de sofrer uma ação de despejo por fata de pagamento, efetue a chamada "purgação de mora" para evitar a sua desocupação forçada. Ou seja, caso o locatário for acionado judicialmente, ele poderá então pagar o débito integralmente, devidamente acrescido de todos os encargos (multa, juros, atualização monetária, honorários advocatícios e custas judiciais). Porém, atenção, porque a purgação da mora somente pode ser realizada uma vez a cada 24 meses.
Por fim, no âmbito de recuperação judicial, embora não concorde com essa linha de raciocínio em vista da essencialidade dos pontos comerciais para os varejistas, impõe registrar que o entendimento majoritário é no sentido de que, em existindo inadimplência por parte dos inquilinos em processo de recuperação judicial, os locadores estarão, da mesma maneira, autorizados a promover os despejos. Nesse ângulo, eventual procedimento de recuperação judicial pautada em débitos locatícios deve ser previamente e cautelosamente estudado.
Daniel Cerveira é advogado, sócio do escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen & Longo Advogados Associados. É consultor jurídico do Sindilojas-SP.