Caxias do Sul 22/11/2024

Desafios da retomada consciente

Favorecer a mobilidade e valorizar o transporte coletivo são as questões que se impõem ao setor na pandemia
Produzido por José Carlos Secco, 01/06/2020 às 09:15:55
Foto: ARQUIVO PESSOAL

O plano de retomada consciente apresentado pelo governador do Estado de São Paulo, João Dória, é mais uma oportunidade para que os governantes foquem, invistam e elevem a imagem do transporte coletivo urbano, valorizando o serviço e, de certa forma, evitando a evasão de usuários.

A retomada e reabertura de diferentes segmentos vai aumentar, a partir desta segunda-feira (1º de junho), a demanda pelo transporte coletivo (ônibus, metrô e trem). Espero que mais do que “adequar a frota”, as secretarias de transporte estadual e municipal tenham, como prioridade, cativar as pessoas que voltarão a utilizar o sistema, oferecendo mais conforto, segurança, pontualidade e distanciamento.

Qualquer coisa diferente disso, será vista como indiferença para com todos aqueles que precisam sair de suas casas para trabalhar.

Como havia mencionado anteriormente, o transporte coletivo precisa ser visto como prioridade no combate à crise gerada pela pandemia e, para isso, governadores e prefeitos teriam de entender que é mais barato e eficiente diminuir o contágio na ponta e não somente ter mais leitos à disposição. Isto é eficiência e qualidade na utilização dos vultosos recursos destinados a estados e municípios pelo governo federal.

O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, defende que parte deste recurso seja revertida para o financiamento do transporte público, nas operações de ônibus, trens e metrôs. E por manter entenda-se oferecer serviço adequado ao momento vivido.

Ele afirmou que o transporte coletivo não pode parar e não se pode federalizar o problema, pois a mobilidade urbana precisa ser contemplada pelos estados e cidades com parte dos recursos de R$ 60 bilhões do plano de auxílio a estados e municípios. O estado do Rio Grande do Sul foi o terceiro mais favorecido na distribuição de recursos, com R$ 1,945 bilhão, e São Paulo o primeiro, com mais de R$ 6,6 bilhões.

Também Paulo Skaf, presidente da Fiesp, mostrou preocupação com o planejamento para o transporte coletivo de São Paulo nessa retomada consciente e destacou que não viu nenhum plano para suportar o crescimento de demanda e garantir um serviço eficiente e seguro.

A liberação desses recursos de auxílio deve ser vista como uma ferramenta fundamental para se evitar que ocorra uma perda significativa de demanda do transporte público de trilhos e pneus no pós-pandemia, segundo aponta recente estudo internacional da BloombergNEF.

Precisamos aproveitar este momento para mostrar para o cidadão que o uso inteligente do transporte coletivo significa o seu bem-estar, saúde e segurança. Se não o fizermos agora, nunca mais conseguiremos. Só e talvez, com ainda maior e dispendioso esforço e gastos.

É claro que, no curto prazo, o volume de pessoas em circulação será menor, quer pela crise econômica e perda de postos de trabalho, quer pelas restrições, receios e novos hábitos que já estamos adotando. Mas dentro do que será o mundo pós-pandemia, o transporte coletivo continuará a ser o meio de mobilidade mais indicado, por vários motivos:

Custo – o transporte coletivo continuará a ser o meio mais econômico e acessível, ainda mais em uma sociedade depauperada pela pandemia e crise econômica;

Consciência – a pandemia tem mostrado vários aspectos que não chamavam a nossa atenção, como a necessidade de pensarmos mais no coletivo e menos no individual, para um mundo melhor e seguro.

Mas, na retomada, será obrigação dos governos e dos prestadores de serviços garantir a segurança e o bem-estar de quem utiliza. Para isso, como já mencionei, somente a máscara não será suficiente e já existem soluções disponíveis para desinfecção de ambientes, com ação antimicrobiana.

Eficiência – o transporte coletivo bem aplicado é o meio mais eficiente de locomoção em centros urbanos para a grande maioria da população;

Tecnologia – o desenvolvimento de soluções de biossegurança para desinfecção dos ambientes, utilização de luzes UV para eliminar vírus e bactérias, sem falar na utilização de veículos menos poluentes no transporte de massa são formas mais rápidas e mais efetivas do que depender da iniciativa isolada de cada indivíduo.

Ao invés de apenas esperar ou sentenciar por antecipação a perda de usuários por parte dos meios de transporte coletivo, o que deveria ser feito é uma campanha e ação para mostrar que o mundo pós-pandemia deveria se pautar e retomar priorizando somente as soluções que, de forma sustentável, promovessem o bem-estar e permitissem o desenvolvimento de toda a sociedade, dos mais necessitados ao mais ricos.

Conheço muitas pessoas que preferem e usariam o transporte coletivo diariamente se o serviço fosse melhor. Os jovens já não dão prioridade ao transporte individual e, se as gerações seguintes forem estimuladas a pensar assim, o número de usuários crescerá e não diminuirá.

Por que continuamos sem enxergar e dar foco no essencial para um novo mundo pós-pandemia?

Deixar o fácil e imediato para trás e fazer as escolhas baseadas no que promove o bem-comum e preserva o futuro de todos de maneira sustentável.

E, neste cenário, mudar a nossa mentalidade e visão com relação ao papel do transporte de massa.

Isso demandará enormes investimentos em melhorias e na ampliação da oferta para torná-lo mais eficiente, seguro e satisfatório.

Ouça o podcast aqui:

RETOMADA CONSCIENTE É MAIS UMA CHANCE PARA FAVORECER A MOBILIDADE E VALORIZAR O TRANSPORTE COLETIVO

José Carlos Secco é jornalista especializado na indústria automotiva e de transportes, diretor da Secco Consultoria de Comunicação, de São Paulo, com atuação inclusive na Serra Gaúcha.

E-mail: jcsecco@secco.com.br

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