Caxias do Sul 05/02/2025

Crônica pré-natal

Quem realmente nasce em 25 de dezembro é o ano que vem
Produzido por Paulo Damin, 21/12/2024 às 09:54:42
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul
Foto: ARQUIVO PESSOAL

Em vez duma crônica de Natal, vou fazer uma pré-natal. Que nem o exame aquele pra ver se está tudo bem com o bebê. Ou seja, com o ano que vem.

Com todo o respeito ao Papai Noel e a Jesus Cristo, que são personagens pacíficos, quem realmente nasce em 25 de dezembro é o ano que vem. O réveillon é apenas uma festa pra quando o bebê chega em casa, depois de ficar uma semana no hospital, na incubadora. Porque nasceu prematuro, talvez, ou com alguma doencinha que sequer um bom pré-natal consegue evitar.

Mas o que um bom pré-natal sim evita é a desnutrição. Então vejamos: do que o ano que vem está sendo alimentado?

Isso é fundamental. Alimentar hoje o ano que vai nascer. Com histórias, com canções. Dar o feijãozinho da poesia pro nosso filhote. Acostumá-lo desde já a beber a água da música feita com instrumentos.

Esse é o espírito de Natal, um clima rosinha como bochecha de bebê saudável. Mas pra garantir isso temos de fazer uns exames, tirar sangue, verificar a presença de bactérias.

Será que o ano que vem já vai nascer vermifugado? Ou seria o caso de tomar um mebendazol? Tem também as receitas caseiras, como alho cru, que já ajuda a espantar vampiros. Deus o livre o ano que vem nascer com um vampiro no cangote.

Outro exame importante é aquele pra identificar a posição do bebê no útero, se de frente ou de costas pra mãe, se com a cabeça pra cima ou o contrário. Será que o nosso aninho novo já está devidamente de cabeça pra baixo? É assim que tem de ser. Por isso que todo ano sempre nasce meio bagunçado, só quer saber de férias, de carnaval.

Quanto ao cordão umbilical, no pré-natal a gente vê se ele está enrolado no pescoço ou, como preferem os gaúchos e sertanejos, na mãozinha, em forma de laço.

Mas não podemos esquecer os exames mais básicos, pra verificar se a criança tem todos os membros, todos os olhos, e se tem coração. Muito triste um ano sem coração.

Quer dizer, não basta a gente ficar contente por sentir que o ano que vem já está dando chutinhos. Temos de fazer o possível pra que sejam chutinhos esportivos. Que não nos nasça um ano perverso, desses que rasgam livros e tacam fogo nos coleguinhas, nem um ano mimado, desses que só querem saber de mercado, ou cheio de mimimi porque não ganhou os toddys.

Não dá pra evitar tudo num pré-natal, é verdade. Mas a gente pode ir pensando. Que o ano que vem seja fruto de uma gravidez planejada.

Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.

Do mesmo autor, leia outro texto AQUI