A segunda conferência do II Simpósio de Língua e Literatura Portuguesa, no Rio de Janeiro, teve como estrela o eminente Afrânio Coutinho (1911-2000). Ela aconteceu no dia 16 de janeiro de 1968, terça-feira, sobre o tema A Nova Crítica.
Afrânio Coutinho começou esnobando os que afirmavam que a Nova Crítica procedia do New Criticism anglo-americano, que é do século XX. E disse que bastava abrir os olhos para perceber que a Nova Crítica começou bem antes, ainda no século XIX, quando teve início uma reação contra a historiografia, contra o cientificismo de Taine, contra o positivismo de Comte e a ênfase dada às biografias.
Não teve um inventor, mas “procede de vários núcleos culturais”, que desembocaram no formalismo russo, no Círculo de Praga, nos estudos estilísticos na Espanha e Alemanha e, mais tarde, também no new criticism.
A seguir, prosseguiu com uma aula magistral sobre a “Genealogia da Nova Crítica”, a partir de seus antepassados, que são inúmeros, a começar pelo maior deles, Coleridge (1772-1834), que, além de poeta, foi o “mais lúcido dos críticos”. Depois dele, a lista cresce em todo o Ocidente: Oscar Wilde, Gourmont, Ezra Pound, T. S. Eliot, Benedetto Croce, Bachelard, Lévy-Strauss... E, no Oriente, René Welleck e o Círculo Linguístico de Praga, mais o Formalismo Russo, em direção ao estruturalismo.
Feito esse longo percurso histórico, Afrânio Coutinho passou a defender o que chamou de Ideias fundamentais para a crítica literária no Brasil, que anotei no caderno:
1 - Necessidade da criação de uma consciência crítica para a literatura.
2 - Valorização do estudo superior, nas Faculdades de Letras, sistematizado: assim está se produzindo uma consciência crítica.
3 - Reconsideração dos aspectos técnicos da poesia e prosa.
4 - Valorização do estético na obra de arte. E criar métodos que penetrem o intrínseco.
5 - Estabelecer critérios estéticos com objetivos científicos (no sentido de exatos, rigorosos, adequados ao fenômeno estético).
6 - Relegação da biografia a plano secundário com os outros fatores: sociológico, ambiental etc.
7 - Periodização: rever o conceito do estilo de época a partir das grandes criações individuais.
Para dar ideia do ambiente, registrei também estas observações:
Afrânio não preparou a conferência: repetia-se, lia um papel aqui, outro ali. E falou duas horas. As perguntas (por escrito), apresentadas no fim, foram um pretexto que as moças aproveitaram para desfilar na passarela, e bem elegantes. Posta a palavra à disposição, falou o prof. Emanuel Pereira Filho: badalou Afrânio e enrolou algumas frases de efeito. Talvez para não ficar esquecido.
Não fiz perguntas nem pedi a palavra, embora tivesse uma dúvida: essa preocupação científica pretende transformar a crítica literária numa ciência exata? Parece-me que ela não atinge o cerne da obra de arte, que é o seu sentido. Em outras palavras: há necessidade de se responder o que é a estética, e essa é uma questão metafísica.
Perguntas que só ficaram no meu caderno de anotações...
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
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