Quando se trata de desenvolvimento de municípios, as iniciativas que aliam poder público, expertise privada e interesse de investidores têm boas chances de sucesso. É essa a receita que explica o êxito da multipropriedade de imóveis, que já se provou um impulsionador do turismo e da geração de emprego e renda em algumas regiões do Brasil. O formato nasceu na França no pós-guerra, como uma resposta à necessidade de reconstruir áreas devastadas.
Nesse modelo, a propriedade é compartilhada por vários donos. Na prática, eles adquirem frações (cotas) do imóvel, do qual podem usufruir em datas determinadas do ano, proporcionais ao valor pago para a compra das respectivas frações. Além das datas, os donos do imóvel também rateiam os custos fixos e de manutenção. Por isso, a multipropriedade é ideal em regiões paradisíacas ou com potencial turístico, permitindo o uso do imóvel para hospedagem de turistas.
Há vários exemplos bem-sucedidos, como a cidade de Orlando, na Flórida, campeã em quantidade de empreendimentos multipropriedade. No Brasil, um dos casos mais emblemáticos é o de Olímpia, município paulista de 55 mil habitantes. Ainda no mercado brasileiro, também são destaques megacomplexos em Caldas Novas, em Goiás; Armação dos Búzios, no Rio de Janeiro; em Aquiraz, no Ceará, e em Gramado, na Serra Gaúcha.
O poder que a multipropriedade tem para desenvolver uma cidade passa pelo fato de incentivar um fluxo constante de turistas. Como cada proprietário de cota tem direito a usar o imóvel por um período (a depender da quantidade de frações em que o imóvel foi “dividido”), o município pode contar com a presença dos visitantes durante todo o ano – deixando de depender dos períodos de alta temporada. Com essa previsibilidade, o varejo, as agências de turismo, os restaurantes, bares e demais integrantes da cadeia do turismo podem planejar investimentos e contratar mão de obra. É criação direta de emprego e renda, além de arrecadação de impostos para os cofres municipais.
Do ponto de vista do comprador, a multipropriedade é uma forma de diversificação de investimentos no mercado imobiliário. Além de demandar um desembolso bem menor para a aquisição de frações em comparação ao valor pago na compra integral de um imóvel, a liquidez é maior. Ou seja, em caso de venda das frações, a negociação costuma ser facilitada, pois o valor de venda é menor em relação ao preço integral do imóvel - e a compra das frações pode ser feita por proprietários que desejarem garantir mais datas para o uso.
O estudo Cenário de Desenvolvimento das Multipropriedades no Brasil, da Caio Calfat Real Estate Consulting, mostra que o valor geral de vendas (VGV) no Brasil somou R$ 79,5 bilhões em 2023, representando alta de 33% na comparação com o registrado em 2022. No final de 2023, havia no país 200 empreendimentos multipropriedade em 89 cidades de 19 estados. Nos EUA, país que tem o maior mercado desse modelo, são 2,5 mil.
Em 2023, a multipropriedade chegou a novos destinos turísticos brasileiros: Atibaia (SP); Maragogi e Barra de São Miguel (AL); Conde (PB); Porto Belo, Itá e Tijucas (SC); e São Francisco de Paula (RS). O modelo pode, ainda, ser uma alternativa para a reconstrução de áreas do Rio Grande do Sul atingidas pela tragédia das chuvas de maio passado, já que o Estado tem diversas regiões com vocação turística. Atuando no sul do país, inclusive, é reconhecida a Gramado Parks, que tem um catálogo com imóveis de multipropriedade em várias localidades. Outros exemplos são o Lagoa Eco Towers, em Caldas Novas (GO), Golden Tulip Gravatá (PE) e Livyd Angra dos Reis (RJ).
Muitas cidades brasileiras que nem sequer são lembradas pelos viajantes podem passar a fazer parte do mapa do turismo ao adotar a multipropriedade. Mas, para isso, é necessário um esforço conjunto. Até porque o resultado dessa equação é positivo para todos os envolvidos: as cidades têm melhora socioeconômica, os investidores diversificam os portfólios, os empreendedores criam mais projetos e as prefeituras podem aumentar a arrecadação. Um ganha-ganha em que vale a pena apostar.
Marcos Jorge é CEO da RTSC Holding.