Com o buraco no peito, seguia à procura de alguém que pudesse auxiliá-lo, preenchê-lo talvez. Ou, quem sabe, estancar a dor que sentia e que não queria abandoná-lo.
Procurava fora o que só poderia cuidar/curar de dentro para dentro dele. E isso implicava conseguir verdadeiramente se enxergar e cuidar do que ali via. Ir ao encontro de pessoas que pudessem ajudá-lo a zelar ou a descobrir o que não sabia que existia, e nem como tomar conta disso. Esse era seu grande desafio. Esse era o caminho que acendia uma chama de poder sair daquele lugar.
Em nome dessa dor, ele se abandonava e vibrava sempre no mesmo sentir. Até descobrir que, antes de sarar, precisava realmente entrar e olhar para tudo que estava ali.
A ferida estava aberta. O outro provocou para que ela se abrisse, e ele não conseguiu se proteger, deixando-a aberta e vendo-a ocupar um grande espaço em si. Poderia ter se protegido um pouco mais. Poderia não ter absorvido. Talvez, se não tivesse se dedicado tanto, a ferida não estaria aberta e a machucá-lo intensamente. Ou, quem sabe, se não tivesse criado tantas expectativas quanto teve, não teria tamanho buraco aberto em si.
Só agora percebia tudo isso. E a constatação de que olhou muito para o outro e pouco para si vinha, com uma força enorme, mostrar-lhe o quanto se equivocou.
Talvez cuidou demais, deu demais, criou muito desejo e agora se via a olhar grandes costas a se distanciarem de si e de todo afeto que havia construído. Mas ficava claro que o afeto era de um lado só. “Só seu!”. O “nós” não fora edificado como realmente desejava, como poderia engrandecer aquela relação.
O retorno valoroso não vinha. Construir sozinho uma relação que precisava de dois ou a falta do que não enxergou antes, deixava-o diferente, pois agora enxergava o que antes não via. Aliás nunca conseguiu perceber da maneira como chegava até ele agora. E isso fazia-o não desejar mais construir de um lado só. Percebia que alguém ficara ausente naquela relação, e não era ele... Ele deu demais, sufocou. Quem sabe...
Diante dessa constatação, o que fazer, além de cuidar, acolher, aconchegar as dores que sentia e, assim, serenar a angústia que o acompanhava para que, pouco a pouco, ela se dissolvesse e a vida voltasse a inundá-lo. Agora, com menos entrega, menos controle e mais parceria.
Quando o buraco no seu peito se abre, como você cuida dele, ou melhor, como cuida de você?
Neusa Picolli Fante é psicóloga clínica especialista em lutos e perdas. É palestrante e escritora, autora de oito livros: três de psicologia, três de crônicas e dois de poesia.
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