A Festa da uva de 1972 se tornou famosa – talvez a mais famosa de todas – porque no dia 19 de fevereiro, com a presença do Presidente Médici, aconteceu a primeira transmissão a cores da televisão brasileira, mostrando o corso alegórico a desfilar pela Rua Sinimbu e pela praça central. Isto é, as primeiras imagens a cores enviadas ao país inteiro foram um desfile de carros da Festa da Uva!
Não deixa de ser uma montagem do destino que o cinquentenário desse acontecimento, indelével na memória do Brasil, ocorra durante outra Festa da Uva, que em princípio não estava prevista para ocorrer nesta data. No próximo sábado, também um 19 de fevereiro, certamente esse episódio será lembrado e celebrado.
E de onde nasceu a ideia de lançar na Festa da Uva de Caxias do Sul a transmissão a cores?
Outra armação montada pelo destino esteve atrás da cena. Ocorre que o Ministro das Comunicações, na época, era um caxiense: Higino Corsetti. Como militar de carreira, teve espaço aberto para atuar durante todo o período de governo militar. Outro ministro com forte presença no mesmo período do governo Médici – abriu a Transamazônica e instalou a Ponte Rio-Niterói – era também caxiense: Mário Andreazza, filho de Atílio Andreazza, perenizado como nome de rua no bairro Sagrada Família.
Uma pergunta que emerge dessas aparentes coincidências é certamente esta: o que levou Higino Corsetti e Mário Andreazza a seguirem a carreira militar? E a pergunta pode ser ampliada para outras personalidades oriundas da imigração italiana: como a de Euclides Triches, que deixou uma trajetória também indelével.
A esses nomes pode ser acrescido ainda o do coronel Sérgio Pasquali, nascido na colônia de Guaporé, e que foi idealizador do Projeto Rondon. Um projeto patriótico por excelência. Sérgio Pasquali – já relatei aqui esse episódio – promoveu uma mostra fotográfica da cultura italiana, organizada pelo Projeto Ecirs da UCS, no Teatro Nacional de Brasília.
Seguir a carreira militar era quase a única alternativa para avançar nos estudos, nas primeiras décadas do século passado, sem custo para a família. E, não por acaso, os nomes citados optaram por cursar Engenharia no Colégio Militar. Meu pai também esteve à beira de seguir esse caminho, que apontou para mim como uma alternativa. Alguma força oculta, porém, me fez seguir em outra direção...
Mas, retornando ao tema do título desta crônica, o fato de a transmissão a cores ter começado numa Festa da Uva, por articulação de caxienses próximos do poder, mostra também uma faceta “de quem somos e do que fazemos”, na fórmula proposta por Olmiro de Azevedo.
A Festa da Uva de 1972 ficou também marcada porque, durante sua realização, foi tomada a decisão de buscar espaço mais amplo para atender às exigências cada vez maiores do evento. A Festa seguinte, realizada em 1975, coincidindo com a comemoração do centenário da chegada dos imigrantes italianos, já teve como cenário o atual Parque de Eventos, que depois passou a ter o nome de seu idealizador e construtor, o prefeito Mário Bernardino Ramos.
A história da Festa da Uva tem esta característica: cada uma delas deixa uma nova marca. Como esta de 2022, com certeza, também vai deixar.
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
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