A chegada do trem, no dia primeiro de junho de 1910, e a elevação da Vila de Santa Teresa de Caxias à categoria de cidade, no mesmo dia, mês e ano, tiveram dois significados importantes para a história de Caxias do Sul: foram um reconhecimento dos resultados conseguidos pelo imigrante italiano até aquele momento e trouxeram muitos benefícios pela consequente abertura de novas perspectivas.
O reconhecimento se dava, agora de forma concreta, pela consolidação das palavras que Júlio de Castilhos havia pronunciado 15 anos antes em visita à Vila de Caxias. Na ocasião, ele criou o consagrado epíteto de “Pérola das Colônias” e anunciou que faria o trem chegar até ela. Era o poder público reconhecendo o esforço do colonizador e se dispondo a criar novas condições de crescimento.
Com o título de cidade, Caxias ganhava novo status político e de cidadania, passando a ombrear com outras localidades já centenárias no Rio Grande do Sul. E a chegada do trem era a confirmação de que também no plano econômico, no social e no cultural, haveria retorno para esse investimento. Nem o trem teria chegado, nem a vila se transformaria em cidade se Caxias não tivesse já feito por merecer.
Os benefícios daí decorrentes podem ser postos em três níveis:
No plano econômico, surgiu a possibilidade de investir em produtos de comércio externo, e não apenas para o consumo interno. Com esse propósito, foram feitas tentativas de cultivo do bicho-da-seda, da oliva e da viticultura, todas com apoio do poder público estadual. O cultivo que acabou tendo sucesso foi o do vinho. O chamado ciclo da madeira foi também beneficiado pela estrutura de transporte ferroviário. Ainda no plano econômico, o comércio tomou maior volume e gerou recursos para investimento na indústria, em especial a metalmecânica. Estavam lançadas as bases econômicas para a Caxias do futuro.
No plano social, ampliaram-se os serviços nas áreas da educação pública e privada, da saúde, do esporte e do lazer. A instalação de uma unidade do exército nacional foi também um privilégio.
No plano cultural, a cidade passou a ter possibilidades de trazer espetáculos de teatro e de música. A vida esportiva, fonte de intercâmbio e integração, surge com toda a força já na década começada em 1910. Os clubes sociais crescem e se multiplicam; a imprensa vai se tornando cada vez mais ativa.
Em resumo, os dois fatos – a chegada do trem e a elevação à categoria de cidade – criaram os rumos para a Caxias que conhecemos. Se não tivessem acontecido, nossa história e nosso perfil de desenvolvimento, de que tanto nos orgulhamos, teriam sido bem outros.
É verdade que o trem não está mais sendo usado para esses benefícios, mas seu valor simbólico segue inalterado. Para alimentar meu orgulho pessoal, a filmagem de O Quatrilho criou uma oportunidade para o trem visitar Caxias do Sul pela última vez, levando depois essa imagem para o mundo. E a arquivando na memória da cidade.
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
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