Só assim me construí mais forte, com um sorriso entre os lábios que vem de dentro – quebrando qualquer resistência.
Só assim ampliei meu olhar... olhei pra dentro e pra fora, e pude me/te alcançar, e a tudo integrar.
Todos nós, em certo momento da nossa vida, atravessamos o nosso deserto... Solitariamente, de cabeça baixa, olhos a acompanhar o chão, buscando a coragem de um novo recomeçar – invadidos por lembranças (que fazem o peito estalar) -, nos encontramos, resgatando a força e a direção, principalmente percebendo as conexões acontecerem.
Existem os que atravessam seu deserto amargurados – com tanta amargura que não conseguem olhar, nem pra fora, nem pra dentro, e ver o brilho dessa jornada. Outros, com a força da vida, sabendo que este momento vai se desintegrar, formando uma nova maneira de ressignificar - andam.
Há os que atravessam nem pisando no chão, de cabeça erguida, não na humildade, mas na contramão.
O fato é que cada um de nós atravessa o seu deserto, do seu jeito, com os recursos que tem. Ou, com como conseguiu se restituir dos solavancos da vida... Atravessa seu deserto à sua maneira – pois ele é só seu. Busca infinita por se encontrar.
No meu deserto tem chão quente, vento frio, palavra ausente, sentimento amorfo – fico sem ar para respirar... Fiquei mais forte, enxerguei além, porque atravessei o meu deserto...
Encontrei muitas pessoas pela vida, que também atravessaram seu deserto. Via-as no exato momento em que o atravessavam... Me inebriei com o subir do ser nessa nova jornada... Aplaudi a sua transformação.
Me detive um pouco mais nesse olhar... Muitos percebi que se fortificaram. Embora obtivessem respostas no momento exato desse exílio de descompensação. Sim, num primeiro momento, a dor é tanta que só o lamentar se escuta... Fiquei ali a acompanhar o vazio que se apresentava, e pude perceber a ressignificação da vida que se instalava.
Dei a mão para outros tantos, nas sombras que os amedrontavam. Eu também tive a mão de algumas pessoas ao atravessar o meu desabitado momento. Só assim pude me resgatar. Só assim auxiliei o outro a se encontrar, a achar o caminho desse novo estar...
Degrau após degrau, num novo sentir, ele/eu nos encontrávamos. Da ladeira do penhasco atravessamos o nosso deserto...
Ao atravessar meu deserto fui avisada de coisas que meu “eu” dormindo não percebia. Na plenitude daquele momento, um novo estágio de consciência se construía...
Atravessei o meu deserto, ali o “eu” que existia não se encontra. Presa na incompletude de quem eu era, secaram-se as raízes que se mantinham. Banida de vida, procurei a mudança de consciência da vida, que pouco a pouco ali se instalou.
Eu fui. Não tenha medo de atravessar o seu deserto... Afinal, ele é só seu, e você é capaz!
Você se surpreenderá com o desfecho da jornada. Passe por dentro, passe devagar. Alimente seu dia, que o deserto se desmanchará...
Pessoas de luz, com brilho próprio, andaram em seu deserto, sozinhas, mas não solitárias; tristes, mas com a esperança palpitando dentro de si...
Você se surpreenderá com o desfecho da jornada.
Neusa Picolli Fante é psicóloga clínica especialista em lutos e perdas. É palestrante e escritora, autora de oito livros: três de psicologia, três de crônicas e dois de poesia.
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