Caxias do Sul 22/11/2024

ANOTHER ROUND é percurso para autodescoberta

Sem cair no moralismo ou na apologia, filme dinamarquês traz atuação magistral de Mads Mikkelsen
Produzido por Eulália Isabel Coelho, 13/02/2021 às 18:25:54
Foto: LUIZ CARLOS ERBES

Por Eulália Isabel Coelho

"É uma história belíssima escrita sobre abraçar a vida durante o difícil período da crise de meia-idade".

Assim o ator Mads Mikkelsen, 55 anos, define Another Round (Druk, 2020), filme do diretor dinamarquês Thomas Vinterberg, que chega aos cinemas brasileiros no dia 25 de março, em distribuição da Vitrine Filmes com a Synapse Distribution.

A produção, que disputa o Globo de Ouro em 28 de fevereiro, é a representante da Dinamarca ao Oscar 2021, que acontece em 25 de abril. O filme tem participado de festivais internacionais e já recebeu vários prêmios. Por sua originalidade, elenco, direção e roteiro, o longa deve receber mais alguns nessa temporada de premiações.

Druk narra a história de quatro professores de uma escola dinamarquesa unidos pela amizade e também pelo desânimo. São quatro homens cujos sonhos juvenis deram lugar ao comodismo, à zona de conforto, à falta de perspectivas. Eles estão estagnados em suas vidas estáveis, profissionalmente, nas relações familiares e até na solidão.

O que poderia mudar essa situação? Um experimento etílico para testar a hipótese do psiquiatra norueguês Finn Skårderud de que falta ao ser humano 0,5% de álcool em seu organismo. Essa dose, diária aumentaria o ânimo induzindo à criatividade.

Mads Mikkelsen, um ator como poucos

Um Martin revigorado em sala de aula

Martin (Mads Mikkelsen), Tommy (Thomas Bo Larsen), Nikolaj (Magnus Millang) e Peter (Lars Ranthe), então, colocam em prática um “ensaio científico”, cujo escopo delimita beber os 0,5% antes de entrar em sala de aula. Ao que se sabe, tal hipótese é livre criação dos roteiristas, não sendo proposição do psiquiatra citado no filme.

Longe de ser uma apologia ao consumo alcoólico ou um panfleto moralista, o longa é uma jornada de autorreflexão ao fazer um recorte da própria cultura dinamarquesa à qual o álcool é intrínseco. Não à toa, a obra abre e termina com celebrações em que divertimento e bebida são parte de uma mesma equação.

Partindo dessa premissa, temos camadas que vão se descortinando, permitindo assim que se aviste a essência de cada personagem, em especial Martin, um Mads Mikkelsen em performance magistral. Em suas primeiras aparições, o professor se mostra vulnerável e melancólico. Um homem cuja angústia existencial mina suas forças.

Martin é um professor de História com ar cansado e pouca disposição ao lecionar. Esse homem permite aos amigos que sintam sua estrutura abalada pela ausência de expectativas, na verdade, a mesma deles. É nesse momento que surge a ideia do experimento.

Os amigos guiados por sua pesquisa etílica

Alegria e descontração na jornada de trabalho

Com os 0,5% de álcool, esses homens de meia-idade recuperam a jovialidade, abrem-se a novas percepções, voltam a ser criativos e decidem ir mais longe em sua pesquisa. Se os resultados podem ser perigosos, eles também servem para ensinar-lhes algumas lições.

Martin, Tommy, Nikolaj e Peter tornam-se estudantes de sua própria abordagem, de suas escolhas, às vezes duvidosas. Eles precisam aprender por si mesmos os seus limites diante de possibilidades desastrosas. Como isso se dá é a grande sacada do roteiro, que vai acompanhar os quatro amigos sem cair no excesso dramático ou no humor negro. É fascinante como Vinterberg resolve seu enredo.

Martin em celebração junto aos alunos

A obra, em seu cunho existencialista, cita o filósofo Soren Kierkegaard, já na abertura:

“O que é a juventude?

Um sonho

O que é o amor?

O conteúdo de um sonho”

A citação é provocativa, como a obra de Vinterberg, se a olharmos com olhos de pescar miudezas do coração e da alma. Com olhos de ver para além do que nos é proposto. O cineasta é um mestre em lançar questionamentos em seu cinema tão peculiar.

Por fim, garanto que você vai querer conhecer a banda dinamarquesa Scarlet Pleasure, que, com o hit “What a Life”, dá forma a uma espécie de hino catártico no ato final.

Assista ao trailer legendado AQUI

Sente o som de “What a Life” AQUI

FICHA TÉCNICA

Another Round (Druk) (Dinamarca/Suécia, 2020)

Direção: Thomas Vinterberg

Roteiro: Thomas Vinterberg, Tobias Lindholm

Fotografia: Sturla Brandth Grøvlen

Elenco: Mads Mikkelsen, Thomas Bo Larsen, Magnus Millang, Lars Ranthe
Duração:116 min

FILMOGRAFIA

Longe Deste Insensato Mundo (2015)

A Caça (2012)

Submarino (2010)

Querida Wendy (2005)

O Dogma do Amor (2003)

Festa de Família (1998)

The Biggest Heroes (1996)

DE OLHO NO SET

yes Durante as filmagens de Druk, atores e equipe foram proibidos de beber durante o set.

yes O encantador Mads Mikkelsen foi um conhecido bailarino antes de tornar-se ator. Guarde essa informação!

yes Druk recebeu prêmios no European Films Award em quatro categorias: Melhor Filme, Melhor Diretor, para Thomas Vinterberg, Melhor Ator, Mads Mikkelsen, e Melhor Roteiro, Thomas Vinterberg e Tobias Lindholm.

yes O quarteto, Mikkelsen, Thomas Bo Larsen, Lars Ranthe e Magnus Millang, dividiu o prêmio de Melhor Ator no Festival de San Sebastián.

yes Mads Mikkelsen protagonizou o filme A Caça (2012), também de Thomas Vinterberg, um de seus melhores papéis no cinema pelo qual recebeu o prêmio de Melhor Ator em Cannes.

yes Popularmente, ele é conhecido por sua performance em Hannibal, na qual interpretava o Dr. Hannibal Lecter. A série teve três temporadas dirigidas por Bryan Fuller.

yes Thomas Vinterberg lançou o manifesto cinematográfico Dogma 95 juntamente com Lars Von Trier em 1995. A ideia era um retorno ao cinema anterior aos blockbusters hollywoodianos, dos grandes orçamentos e mega efeitos especiais, com a autonomia nas mãos dos diretores/autores.

Eulália Isabel Coelho é jornalista, professora de cinema e escritora

mail bibacoelho10@gmail.com

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