Nem sabia direito o que procurava, mas, no meio da bagunça que sentia, queria um colo, um lugar seguro para se aconchegar - de vez em quando. Desejava alguém que lhe dissesse que ia conseguir o que tanto desejava, e que ia ficar tudo bem...
Passava seus dias nessa procura, no meio das tarefas em que se via envolvido, casa, esposa, filhos, cachorro, vizinho, trabalho... Mas nunca se questionou tanto como agora... Afinal, olhava para os filhos e não desejava que eles sentissem o desamparo que ele sentia...
E isso cada vez ficava mais evidente, berrava dentro dele por um entendimento. Era aquele vazio que vinha lhe visitar de vez em quando... aquele que o deixava sem chão... seu velho conhecido de outrora, que insistia em estar presente.
Como olhá-lo! Ou como entendê-lo, talvez... buscar o sentido disso tudo para se direcionar - era o grande desafio.
Fazia falta um olhar que lhe remetesse segurança, que o empurrasse para mais perto do sentir-se bom. Mas lá dentro algo lhe dizia que nunca era bom o suficiente...
Sabia agora que sintonizava com o que tinha eco nele. Com o que aprendeu como verdade. Assim, reforçava que a linha invisível que o ligava a outras pessoas deixava nele muito desamparo... Hoje, conseguia enxergar com mais tranquilidade, queria também acolher o outro, assim como desejava se sentir acolhido. Ser fonte de amor, a mesma que conseguia ver com a tranquilidade que não teve. Reconhecia que seus pais tiveram menos ainda, e, assim olhando para as gerações passadas, sentia esse desamparo...
Os registros de valor e de afeto faziam falta na vida dele e com certeza na dos seus também, por isso repetia sem nem notar o que ele próprio não aprovava.
Aprendeu só agora que o elo, a ligação que mantinha com as pessoas, tem verdade como parede de fundo, a verdade do que viveu inclusive. E a procura para juntá-la aos dias de agora estava presente, só assim transformaria o desconforto emocional que sentia. Sim, os vínculos que teve desde o início da sua vida estavam presentes... Sabia que o marcavam, em todas as suas vivências e nas cicatrizes que carregava dessas experiências.
Procurava entender por que repetia sem cessar os padrões aprendidos? Talvez porque estavam enraizados nele, talvez porque foi só isso que aprendeu... mas que bom que pôde ampliar o olhar, o sentir e o fazer. Construir diferente do que aprendeu, consigo, com os filhos...
No decorrer da vida, temos experiências emocionais corretivas que nos ajudam a transformar nossos vínculos inseguros da infância por mais seguros... algo que mobilize um novo olhar para a família é uma experiência corretiva. Assim como: uma nova casa, um novo momento, um novo irmão, um novo quarto, um novo emprego, entre muitas outras coisas que possam existir. Um filho também se torna um impulso para os pais transformarem muito do que viveram, em prol de passar mais do que receberam...
Assim, ele seguia transformando os seus vínculos, seus relacionamentos, sua maneira de sentir e ver a vida, para ser um pai mais tranquilo, um colega mais presente... em todos papéis que desempenhava, construía seus ressignificados...
Neusa Picolli Fante é psicóloga clínica especialista em lutos e perdas. É palestrante e escritora, autora de oito livros: três de psicologia, três de crônicas e dois de poesia.
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