Uma festa é sempre feita de muitas dimensões. Principalmente quando ela acontece dezenas de vezes, ao longo de várias gerações, como é o caso da Festa Nacional da Uva de Caxias do Sul, em sua 34ª edição. Em cada uma delas, estão guardados sabores do passado, enriquecidos por novos sabores a cada nova edição.
Na Festa de 2024, que já está chegando, o sabor particular vem do fato de que nela é dada a arrancada para a celebração dos cento e cinquenta anos do início da imigração italiana na Serra Gaúcha. Sesquicentenário que já vem ganhando diversas promessas para sua comemoração.
Para a Festa da Uva deste ano, o tema escolhido, para começo de celebração do sesquicentenário, foi o dos caminhos percorridos pelos imigrantes e dos lugares que ficaram marcados por sua presença e sua ação ao longo do tempo. Essa temática deverá estar presente em toda a programação da Festa. Imagino que esteja nela o eixo do corso alegórico, peça principal a ser apreciada com os olhos e a imaginação dos caxienses e dos visitantes, agora com o título de Desfile cênico-musical.
Num apanhado geral, no item caminhos, podem ser apontados os seguintes percursos históricos;
O primeiro, e talvez mais simbólico por suas raízes, é o caminho da busca do Paese di Cucagna, que no período da emigração na Itália teve o seguinte slogan: La Mèrica è il vero Paese di Cucagna. Acho que esse caminho foi bem explorado em meu romance A Cocanha.
Outros caminhos trilhados foram estes: o caminho da religiosidade e da fé; os caminhos do trabalho: o trabalho agrícola, o trabalho artesanal, tanto rural quanto urbano, e o trabalho industrial; os variados caminhos da cultura, como os da gastronomia, do cancioneiro popular, da arquitetura, e, talvez o mais importante, o da língua Talian, uma “nova língua” neolatina criada nas colônias italianas e reconhecida como patrimônio linguístico nacional...
Todos esses caminhos deixaram muitos lugares marcados. O caminho da fé está presente em capiteis, capelas e igrejas de várias idades: o lugar mais visitado desse caminho é a igreja de São Pelegrino, que enche os olhos dos turistas com as pinturas de Locatelli. O caminho do trabalho, no meio rural, está na presença de dezenas de vinícolas, todas com vinhos saborosos. No meio urbano, o ponto chave é sem dúvida a Maesa: mesmo ainda em fase de montagem, ali está uma amostra gigante do que foi a indústria da cidade nos anos passados. O caminho da gastronomia está recheado de lugares bem atrativos, a começar pelos restaurantes do galeto, também uma invenção para substituir a passarinhada dos primeiros colonos imigrantes. Por fim, no caminho da cultura a lista é enorme e bem recheada. Cite-se apenas o fato de que a Universidade de Caxias do Sul estará lançando o quinto volume do Cansioniero Popolar, também um rico patrimônio da imigração italiana.
Para completar o espírito de celebração, vale contemplar de perto, com muita reverência, o Monumento Nacional ao Imigrante, cuja inauguração está completando 70 anos exatamente em 2024.
Uma festa é sempre preparada para satisfazer todos os sentidos do corpo humano, mais a sua imaginação e a sua inteligência. Vamos viver plenamente esta Festa Nacional da Uva que está chegando!
José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado “O Quatrilho”, que foi adaptado ao teatro pelo grupo caxiense Miseri Coloni; ao cinema por Fábio Barreto, concorrendo ao Oscar e transformado em ópera.
pozenato@terra.com.br
Do mesmo autor, leia outro texto AQUI