POR MARCOS FERNANDO KIRST
Poesia numa hora dessas? SIM! Exatamente em horas como estas é que a humanidade precisa visceralmente de POESIA, porque ela nos torna mais humanos, e a humanidade anda carente de humanidade, ultimamente.
Em 21 de março é celebrado o DIA MUNDIAL DA POESIA, data instituída pela Conferência Geral da Unesco, em 1999, com a intenção de difundir a leitura, a escrita, a publicação e o ensino da poesia no mundo. No Brasil, existe ainda o Dia Nacional da Poesia, celebrado em 31 de outubro, por lei federal, evocando a data de nascimento de Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987).
O Brasil é berçário de inumeráveis excelentes poetas. O Rio Grande do Sul, também. Aliás, vale lembrar que a publicação de livros de literatura no estado (na época ainda província do Império) iniciou-se com POESIA saindo pela primeira vez do prelo, no ano de 1834, em Porto Alegre. Naquela data, a Tipografia de Fonseca & Cia. imprimiu um pequeno livrinho de literatura (o primeiríssimo no gênero impresso nessas terras) intitulado “Poesias Oferecidas às Senhoras Rio-Grandenses”, de autoria de Delfina Benigna da Cunha (1791 – 1857).
A literatura gaúcha nasce, portanto, no seio da POESIA (e não da prosa), pelas mãos talentosas de uma POETA MULHER (e não de um homem escritor). Mulher, poeta, pobre, solteira e cega. Delfina contraiu varíola ainda no berço e viveu sem enxergar seus 66 anos de vida. Sem enxergar as formas, as cores e as luzes, porém, dotada de ampla, profunda e sensível visão interna, que a permitia vislumbrar, como poucos, os meandros nos quais reside a poesia, e deles a trazia à luz, para o enlevo das gentes enxergantes.
O site elenca a poesia de DELFINA BENIGNA DA CUNHA para homenagear as poetas e os poetas do mundo, do Brasil, do Rio Grande do Sul e de Caxias do Sul, que nos fazem constantemente lembrar dos elementos, tanto os belos quanto os dolorosos, que nos constituem enquanto seres humanos. De sua lavra, segue um soneto:
VINTE VEZES LUA PRATEADA
(Delfina Benigna da Cunha)
“Vinte vezes a lua prateada
Inteiro rosto seu mostrado havia,
Quando terrível mal, que já sofria,
Me tornou para sempre desgraçada.
De ver o céu e o sol sendo privada,
Cresceu a par de mim a mágoa ímpia;
Desde então a mortal melancolia
Se viu em meu semblante debuxada!
Sensível coração deu-me a natura,
E a fortuna, cruel sempre comigo,
Me negou toda sorte de aventura
Nem sequer um prazer breve consigo;
Só para terminar minha amargura
Me aguarda o triste, sepulcral jazigo!”