Caxias do Sul 21/11/2024

Os 50 anos do primeiro álbum triplo solo da história do rock

Após o fim dos Beatles, George Harrison deu vazão a seu talento represado e empanturrou os fãs com um punhado de pérolas musicais, em 1970
Produzido por Marcos Fernando Kirst, 30/04/2020 às 11:26:37
Os 50 anos do primeiro álbum triplo solo da história do rock
Foto: DIVULGAÇÃO

Por Marcos Fernando Kirst

Não deve ter sido fácil para um sujeito criativo e talentoso, chamado George, pertencer a uma banda de rock and roll em que o espaço para o empilhamento de canções nos dois lados de vinil dos álbuns era disputado sulco a sulco por uma dupla chamada John e Paul. Portadores de egos mastodônticos, os dois autoproclamados líderes dos Beatles assinavam em parceria suas composições originais (Lennon/McCartney) e lotavam o espaço dos LPs da época com o fruto de suas incontestes genialidades, desacreditando no talento de George Harrison para criar pérolas de qualidade Beatle.

Um talento que ele foi lapidando e moldando com o passar do tempo e que legou ao mundo, ainda na fase da banda (que se dissolveu de 1970), diversas canções de primeira qualidade, a muito custo inseridas nos álbuns da discografia Beatle (composta por 13 discos), provavelmente quando Paul e John estavam olhando para o lado. Assim, quando os Beatles fizeram água, em abril de 1970, 50 anos atrás, George não perdeu tempo e meteu-se no estúdio a fim de deixar, enfim, aflorar tudo aquilo que estava sendo represado pelas amarras e algemas da banda.

Seu grito de liberdade materializou-se também há quase meio século, quando, em 27 de novembro de 1970, o guitarrista dos Beatles, criador de riffs memoráveis para as composições da banda, veio a público com seu primeiro trabalho solo pós-banda, intitulado “All Things Must Pass”, relegando ao passado muita coisa, a começar pela sombra a que foi submetido durante tanto tempo. Sua vinda para a luz exigia espaço, e ele o encontrou lançando o primeiro LP triplo de artista solo da história da música (o primeiríssimo saíra meses antes, em maio de 1970, trazendo uma seleção dos pontos altos do Festival de Woodstock, realizado em 1969 nos EUA, com as performances de vários artistas), num total de seis lados de vinil para abrigar 23 músicas, 22 delas de sua autoria. “Quem é que precisa de Beatles aqui”, parecia estar a dizer.

Álbum triplo de George Harrison

De fato, com a ajuda de vários amigos músicos (entre eles, Ringo Starr, Eric Clapton, Bob Dylan, Phil Collins, Billy Preston, Dave Mason, Ginger Baker, Klaus Voorman, Bobby Keys), George Harrison deu um tapa de luva de ferro na mídia, no mundo, nos fãs, na história e nos ex-parceiros de banda, produzindo o melhor disco pós-Beatles entre todos os seus colegas naquele ano (e durante muitos anos depois). Citar as melhores músicas do álbum exigiria listá-las quase todas, porém, basta evocar algumas delas para se obter uma boa ideia do que o dito “Beatle quieto” havia represado.

MY SWEET LORD foi um sucesso imediato, trazendo alegrias e dissabores a George dali em diante. Alegrias por emplacar um hit de estrondoso sucesso que pautaria toda a sua carreira solo, e dissabor por acabar tendo de enfrentar um processo por plágio, uma vez que seus acordes remontam à música HE´S SO FINE, do conjunto feminino norte-americano The Chiffons. Sente o som das duas canções e faça seu julgamento.

“If Not For You” foi composta por Bob Dylan (a única faixa do álbum que não é de autoria de George) e presenteada ao amigo ex-Beatle. “I´d Had You Any Time” foi feita em parceria entre George e Dylan. Mas o público de imediato reconheceria o valor de outras faixas como “Isn´t it a Pitty”, “Wah-Wah”, “What is Life”, “Beware os Darkness” e a faixa-título, claro, “All Things Must Pass”. Mesmo passados quase 50 anos (faltam apenas alguns poucos meses para o jubileu), suas músicas de estreia solo seguem embalando a trilha sonora da vida de muita gente.

George Harrison morreu em 29 de novembro de 2001, vítima de um câncer que começou na garganta. Deixou uma discografia consistente composta por dez álbuns de estúdio (12, se generosamente forem incluídos os dois álbuns solo que produziu ainda na época dos Beatles, de música instrumental esquisita, que não resistem a uma segunda audição) e muitas canções de sucesso. Seu último disco, “Brainwashed”, saiu em 2002, postumamente, um de seus melhores e mais coesos trabalhos. George havia concluído as gravações antes de morrer, porém, a mixagem ainda não estava pronta, o que foi feito por Jeff Lynne e Dhani Harrison, único filho de George.

O último álbum, de 2002

Em 1988, Harrison criou uma superbanda, “The Traveling Wilburys”, composta por uma junção de amigos superastros famosos, para gravar e se divertir: Bob Dylan, Tom Petty (1950 – 2017), Roy Orbison (1965 – 1988) e Jeff Lynne. A “brincadeira” durou até 1990 e resultou em dois álbuns excelentes: “Traveling Wilburys Vol I” e “Traveling Wilburys Vol III”. O volume II jamais foi produzido, pois deveria conter a participação de Orbison, que morreu logo após o lançamento do primeiro disco.

Os Wilburys: Bob Dylan, Jeff Lynne, Tom Petty, George Harrison e Roy Orbison

Em 2000, decidido a colocar um ponto final na questão sobre sua música “My Sweet Lord”, Harrison lançou uma nova versão, desprovida dos acordes que geraram a polêmica. Sente o som aqui:

MY SWEET LORD 2000