Por MARCOS FERNANDO KIRST
Entre os anos 2000 e 2002, assinei uma coluna semanal de crônicas no jornal “Pioneiro”, de Caxias do Sul, experiência que se repetiria em uma segunda fase mais tarde, entre 2010 e 2020.
Naquela primeira fase, alguns textos se destacaram em termos de repercussão junto aos leitores, em uma época em que o retorno chegava ao cronista por meio de telefonemas, cartas (sim: escritas, endereçadas, seladas e postadas no Correio!) e pelos incipientes e-mails.
Um dos que se detacaram na época, publicado em 20 de fevereiro de 2002, é o que reproduzo, com nostalgia, a seguir:
DICAS PARA PRODUZIR LEVEDELOS
Por Marcos Fernando Kirst
É batata! Acorda-se no meio da noite, o coração aos pulos, quase saindo pela boca, as mãos suando e aquela nítida sensação de ter acabado de dar um grito...
Ninguém na casa parece ter acordado, portanto, ou não gritamos tão alto ou o grito não se materializou, tendo ficado entalado na garganta no exato momento em que acordamos de solavanco em meio ao pesadelo.
Porcaria de pesadelo! Dá raiva, mesmo, acordar desse jeito estúpido às três da manhã e, o que é pior, em questão de minutos já nem lembramos mais direito o que foi que sonhamos para nos apavorar daquela maneira.
Culpa de quem? Daquele terceiro prato de lasanha deglutido à meia-noite, pouco antes de deitar, mesmo sabendo que o peso solidificado no estômago só poderia dar nisso. Ou daquele derradeiro cálice de vinho, o último da sequência de outros tantos. Na hora da mesa farta, é fácil esquecer a lei que condena todo o glutão a sofrer os horrores dos pesadelos.
O mesmo ocorre com os filmes de terror que assistimos à noite, sozinhos em casa, com aquele sorrisinho superior de escárnio no canto do rosto que na verdade camufla a consciência de que, dali a poucas horas, nossos sonhos serão tomados por aquele monstro estúpido babão de quem até ríamos durante o filme, mas que agora nos persegue até a hora da morte enquanto não acordarmos de novo com o coração já saindo pela boca e se mandando escada abaixo...
Pesadelos, na verdade, são realmente um saco porque, mesmo que não nos lembremos deles mais tarde, algumas vezes acabam nos fazendo iniciar o dia tomados por um certo mal-estar. O senso comum e os conselhos médicos nos alertam sobre o que devemos fazer, ou principalmente evitar fazer, para que os sonhos ruins não venham dormir conosco. Estresse e comilança são os principais vilões, todos sabemos. Mas o que fazer então para forçar a produção de sonhos bons durante a noite, sonhos não pesados como os pesadelos, mas sim leves, ou seja, levedelos?
Fazer o contrário de tudo aquilo citado anteriormente, claro. Exemplos? Fácil: comer somente urna alfacezinha antes de deitar; beber não mais do que dois copinhos de água; ler um livrinho leve que evoque doces fadas; assistir a um filminho também levinho com final feliz mas não choroso (choro antes de dormir pode espantar levedelos); caminhar bem devagarinho até a cama e deitar-se suavemente, de preferência tendo há pouco escutado bem baixinho um disquinho de musiquinha para hipnotizar ursinhos ou algo do gênero. Ao deitar, povoar a mente apenas com pensamentos positivos nos quais apareçam com muita frequência as palavras “amor”, “perdão”, “bondade”, “calma”, “alegria” e “condescendência” (ops, essa última não... palavras com mais de três sílabas podem espantar levedelos.)
Farei a experiência durante sete noites consecutivas. Saberão do resultado a partir do tom do texto da semana que vem...