POR SILVANA TOAZZA
Parte do acervo de obras de arte do empresário José Antonio Fernandes Martins e de sua esposa, Hieldis Severo Martins, poderá compor uma exposição permanente e exclusiva na futura restauração e licitação do patrimônio histórico da Metalúrgica Abramo Eberle SA (MAESA).
A sala ou galeria levaria o nome do executivo de 89 anos, hoje acionista minoritário da Marcopolo, mas que dedicou boa parte da vida a lutar não só pela fabricante de ônibus - na qual foi o primeiro engenheiro mecânico -, mas pelo setor de mobilidade e transporte do país.
O convite para integrar o projeto partiu da Radar PPP, consultoria com escritórios em São Paulo e Minas Gerais que lidera um dos consórcios habilitados a oferecer ao Executivo municipal estudo de modelagem e ocupação da MAESA, no âmbito de futura concorrência pública de Parceria Público-Privada (PPP). Um acordo de cooperação já foi formalizado entre a família Martins e a Radar PPP, o que será agregado ao estudo como indicativo futuro de projeto de comodato das obras com a prefeitura de Caxias do Sul. Zeca Martins, filho de José Antonio e Hieldis, foi designado em nome da família a falar sobre essa possibilidade de expor as obras de um colecionador apaixonado por arte.
“Eles entendem que a gente precisa compartilhar esse acervo. Ele é muito importante, com foco em artistas nacionais e locais, para ficar restrito a paredes de casa. Mais do que imediatamente, meus pais aceitaram e ficaram muito lisonjeados com esse convite e a oportunidade de propiciar esse contato à comunidade”, declara Zeca.
Zeca, ao lado do irmão Alberto Martins, diz se orgulhar da forma como os pais valorizam e investem em arte há tanto tempo, cujas telas (todas catalogadas) hoje se esparramam por imóveis da família, mas “sempre faltam paredes”.
“A arte é a arte de encantar as pessoas. Meus pais valorizam os artistas locais e garimpam preciosidades, desde artistas famosos até iniciantes. O complexo MAESA nascerá com esse propósito de ser uma vitrine cultural, histórica e de encantar os visitantes. A MAESA tem de absorver as necessidades de toda Caxias do Sul e não de apenas algumas pessoas”, avalia Zeca, acrescentando que, nas últimas edições da Festa da Uva, as candidatas tiveram como parte do treinamento uma visita guiada na casa da família Martins para mergulhar no universo de quadros, esculturas e outras expressões artísticas.
O espaço artístico com o acervo da família Martins na futura restauração da MAESA também poderia ter uma parte transitória (com mudança de peças e quadros) e área para receber outros artistas, sem que isso impactasse nos espaços e acervos já consolidados em Caxias do Sul.
Projeto inicial da Vazquez Arquitetos homenageia pioneiros da indústria
A saber: integra o consórcio liderado pela Radar PPP, entre outros, a caxiense Vazquez Arquitetos, responsável pelo Plano Geral da MAESA, com análise arquitetônica da estrutura e dos possíveis usos do complexo, sugerindo diferenciais como Mercado Público, Museu do Trabalho, Centro Cultural, lojas, área gastronômica e de lazer, Centro de Economia Criativa, Espaços de Inovação, entre outros.
“COLEÇÃO REPRESENTATIVA DA ARTE BRASILEIRA”
Bruno Pereira, cofundador da Radar PPP, salienta que a ideia de agregar parte do acervo de José Antonio Fernandes Martins decorre da expressiva representatividade da arte brasileira contida nessa coleção, o que conversa diretamente com a proposta genuína de transformar a MAESA num palco de cultura, história, gastronomia, inovação, costurando o passado e o futuro num projeto que tenha apelo não só para Caxias do Sul, mas para turistas de outros locais.
“Esse conceito de homenagear uma pessoa notável da comunidade, batizando salas, já é comum em universidades norte-americanas e de outros países”, destaca Bruno.
O executivo ressalva, contudo, que no momento o consórcio está em fase de elaboração de estudos, firmando parcerias, buscando investidores e embasando possíveis caminhos, mas nada disso é certeza.
“Estudos de viabilidade de PPPs são assim, complexos. Se leva a sugestão, mas quem arbitra é a prefeitura”, pontua.
Irmãos Alberto (E) e Zeca Martins emolduram o pai, "Seu Martins" (foto: Leandro Araújo)
INOVAÇÃO NA MIRA
Zeca Martins fez uma visita guiada recentemente à MAESA, conduzida pela secretária municipal de Cultura, Aline Zilli, e se mostrou surpreso com o tamanho e o potencial do complexo, “a perder de vista, inimaginável, cabe tudo lá”.
Tanto que sua mente fervilha já com a possibilidade de trazer a Caxias do Sul um braço de um projeto de inovação no qual vem trabalhando com afinco e logo mostrará a cara no Rio Grande do Sul: uma filial do Onovolab, de São Carlos (SP), a ser instalada num prédio da família Martins em Porto Alegre. Na cidade-natal paulista, o hub de inovação, com startups, pesquisa e desenvolvimento para grandes empresas e universidades, funciona justamente numa fábrica abandonada.
Para ele, seria um sonho potencializar esse projeto com uma extensão dentro da MAESA, um marco da história industrial da cidade e da Serra Gaúcha.
“EU PREFIRO INVESTIR EM ARTE DO QUE EM IMÓVEIS E TERRENOS”
José Antonio Fernandes Martins, "Seu Martins", como é conhecido, hoje se dedica a negócios em várias áreas, incluindo medicina nuclear e tecnologia. Seus olhos brilham quando o assunto é arte. Mandou catalogar, em formato de livro, todos os quadros que, junto com a esposa Hieldis, garimpa em antiquários, galerias e por meio de contatos com colecionadores e apreciadores.
Orgulha-se das peças raras que possui e prestigia pintores brasileiros (inclusive de Caxias e região), como Iberê Camargo, Sergio Lopes, Heitor dos Prazeres, Victor Hugo Porto, Beatriz Balen Susin, Di Cavalcanti, Celestino Machado e Britto Velho. Sua casa mais parece uma galeria de arte. Para onde quer que se olhe há um detalhe a espreitar a curiosidade e enlevar o espírito.
Não há como frequentar a moradia de Martins e não ficar absolutamente seduzido pelo bom gosto expresso em obras de arte como quadros, esculturas, móveis, prataria e pequenos objetos raros de decoração garimpados em antiquários, galerias de arte e pelas viagens ao redor do mundo. A impressão é de se estar circulando por uma galeria. Uma casa inteira ornamentada com arte, inclusive o elevador. Mas não é a única. Outros imóveis e escritórios da família são moldura de sua paixão, hobby, mas também investimento.
“Eu prefiro investir em arte do que em imóveis e terrenos. Arte é uma coisa que você aproveita, curte, embeleza, alegra. Mas para curtir, você tem de conhecer, ler, estudar”, revelou o executivo, em entrevista a essa jornalista, em 2012, admitindo que poucos grandes empresários investem nessa área.
CIDADE DENTRO DA CIDADE
Uma cidade dentro da cidade, podendo comportar tudo. Assim é o patrimônio histórico da Metalúrgica Abramo Eberle SA (MAESA), um complexo de 53 mil metros quadrados e 19 pavilhões, um tamanho inconcebível de ser dimensionado pela mente humana. No auge, a indústria chegou a empregar 7 mil funcionários.
Por isso, faz-se necessário muito estudo, muita análise, para que esse conjunto arquitetônico, que já representou a pujança industrial caxiense do século XX, seja restaurado e volte a oxigenar a cidade convergindo para um conceito de primeiro mundo, que alie arte, história, gastronomia, cultura, entretenimento, lazer, bem-estar.
Por ser algo tão portentoso e cuja viabilidade econômico-financeira precisa ser muito bem fundamentada, dois consórcios se habilitaram a oferecer ao Executivo municipal estudos de modelagem e ocupação da MAESA, no âmbito de futura concorrência pública de Parcerias Público-Privadas (PPPs). O prazo final para a entrega dessas análises amplas é 12 de dezembro deste ano.
De posse desses estudos, a prefeitura vai analisar e submeter à apreciação pública o que melhor se encaixa para a futura concorrência pública de Parceria Público-Privada (PPP). A modelagem inclui diagnóstico e estudo de demanda, projetos de engenharia e arquitetura, operação, modelagem econômico-financeira e modelagem jurídica.
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Assista ao documentário sobre a Maesa, assinado pela Vazquez Arquitetos: