POR SILVANA TOAZZA
Arnaldo Passarin é um sonhador. Mas não só. É um executor, um realizador. Com 86 anos, acaba de agregar ao seu currículo e à sua longa trajetória de liderança do setor vitivinícola mais um feito.
Em meio à pandemia da Covid-19, que intimidou de forma singular o turismo, Seu Arnaldo não se acanhou. Pelo contrário: tem sabedoria para entender que o contexto muda. Que as crises vêm e vão, mas o consumo não só permanece como tem potencial de crescimento.
Dessa forma, espocou em setembro sua mais nova criação: a Cave do Sol, vinícola com toque artístico que integra o eixo enoturístico do Vale dos Vinhedos.
“Me sinto realizado em ver se tornar realidade mais um de meus sonhos, tendo meus filhos e minha esposa envolvidos em cada projeto. São 66 safras aqui no Rio Grande do Sul”, celebra o diretor-presidente da vinícola, com uma trajetória de mais de 30 anos de atuação em cantinas e entidades do setor.
Nunca é tarde para tirar a rolha de um sonho. O paulista de Jundiaí e presidente da União de Vinhos do Rio Grande, empresa com sede em Flores da Cunha, comprou o terreno no Vale dos Vinhedos há 22 anos.
Empreendimento localiza-se no Vale dos Vinhedos (crédito: Augusto Tomasi)
Leia a seguir a entrevista concedida com exclusividade para a seção “Conversa Afiada” pelo empresário Arnaldo Passarin:
Como foi a decisão de construir uma vinícola de ponta no Vale dos Vinhedos?
Em 1998, compramos o terreno no Vale dos Vinhedos, com o objetivo de nos aproximar de uma parcela importante de produtores de uva, facilitando assim a logística de entrega, reduzindo custos com o frete e o tempo de trânsito entre Bento Gonçalves e Flores da Cunha. Na época, já vislumbrávamos o potencial para o enoturismo, que despontava na região como um novo negócio. Em 2000, recebemos a primeira safra no Vale dos Vinhedos e começamos a embalar o sonho de construir um projeto diferente. Vinte anos depois, nasce a Cave do Sol, um projeto novo, moderno e inovador, mas que tem toda a tradição iniciada em 1927, pelo meu pai Guido, que instalou uma pequena produção artesanal de vinhos num quarto da nossa casa.
Foi um sonho realizado?
Costumo afirmar que os sonhos vão nascendo um a um. E sim, a Cave do Sol é a realização de um sonho, não só meu, mas de toda a família.
Qual o número de funcionários e o investimento na nova vinícola?
Temos cerca de 20 funcionários e logo deveremos chegar a 30 colaboradores em função do foco do empreendimento voltado ao enoturismo.
De onde vem a produção de uvas e qual a expectativa e o potencial de vinificação?
O projeto de vinhos finos é mais recente. Nossa produção de vinhos finos é de 100.000 litros por ano, com uvas de diferentes terroirs do Rio Grande do Sul. Temos uvas cultivadas na Serra Gaúcha, Serra do Sudeste e Campanha Gaúcha. Todos os nossos sucos levam o Selo Suco de Uva Puro, idealizado pela Associação Brasileira de Elaboradores de Suco de Uva Puro, aprovado pelo Ministério da Agricultura. São elaborados com uvas da Serra Gaúcha, por produtores que têm uma longa história com a vinícola, os quais têm o nosso grande respeito e gratidão.
O senhor aposta na retomada do turismo?
Acreditamos não só na retomada, mas também num crescimento acelerado do turismo na Serra Gaúcha como um todo e, especificamente, nas regiões vinícolas. Nossa expectativa é na retomada do turismo seguro e de proximidade. Temos certeza que os brasileiros vão querer descobrir o que seu país tem a oferecer. E chegando aqui eles vão se encantar. O Vale dos Vinhedos já é um roteiro consolidado e será uma excelente opção para aqueles turistas que buscam novas e diferentes experiências. Nossa Secretaria de Turismo e a Aprovale fazem um belíssimo trabalho de atração de visitantes e em prol dos estabelecimentos vinícolas da cidade e do Vale dos Vinhedos, respectivamente. Recentemente, Bento Gonçalves conquistou o Selo Mundial de Destino Seguro. E na Cave do Sol estamos preparados para atender bem e com toda segurança que o momento exige.
Como o senhor avalia o mercado de vinhos brasileiros. Há muito espaço para crescer?
O mercado de vinhos brasileiros se encontra num excelente momento, com crescimento acumulado de janeiro a julho de 2020 de 31%, comparando com igual período de 2019. Há espaço para crescer, pois o consumo per capita atual de 2,3 litros por ano é muito pequeno, o que representa uma grande oportunidade para o setor. O brasileiro está descobrindo o seu vinho e vendo que aqui temos qualidade, bom preço e diversidade.
Os altos impostos são ainda entraves?
Os altos impostos são um entrave histórico do setor. As entidades buscam alternativas, estão sempre em contato com diferentes esferas governamentais, em busca de apoio político para resolver este problema. É importante salientar que muitos países que exportam vinhos para o Brasil têm grandes subsídios por parte de seus governos. No Brasil, além dos altos impostos, está em tramitação o acordo entre Mercosul e União Europeia, com o objetivo de zerar os impostos de importação. O Governo promete medida compensatória para que possamos pelo menos trabalhar com igualdade de condições.
A arte é outro atrativo? Como surgiu a ideia?
A ideia de termos obras de arte nasceu do vinho. Pois vinho é arte. Quem visita a Cave do Sol mergulha num mundo de histórias e cultura. Cada peça, cada espaço é uma memória viva da nossa família e da própria vinicultura. As memórias estão em cada detalhe, preservando a história da família e também da vinicultura brasileira, com exposição de equipamentos no interior e exterior da empresa. A arquiteta Vanja Hertcert deu vida ao nosso sonho ao projetar um empreendimento que por si só é a cronologia do vinho, com identidade e personalidade próprias. A preservação da história, através da arte, ocorreu com a transformação de pipas de vinho em móveis e grandes portas. Equipamentos do século passado viraram obras nas mãos de artistas locais, expostas no interior e exterior da vinícola. É a história viva materializada através do Sol Negro, construído com antigas moto-bombas, que dá as boas-vindas a todos que chegam na vinícola. A obra Uvas ao Sol ilumina o entorno da vinícola.
Que dicas daria a empreendedores intimidados pelo momento econômico?
Meu conselho aos empreendedores é para que tenham foco, não desistam nunca e que busquem formas de realizar seus sonhos. Olhem para o retrovisor apenas para compreender que a história se constrói com cenários diferentes. Presente e futuro devem estar no radar permanente do empreendedorismo. A pandemia irá passar. A crise será superada e os negócios irão prosperar.
Obras de arte encantam os visitantes da Cave do Sol